Nesta sexta-feira, 12 de abril, quatro jovens seminaristas do Seminário Propedêutico São José, de Cambé, estiveram no Centro de Pastoral Jesus Bom Pastor, onde está localizada a mitra e a cúria diocesana, para sua formação sobre Liturgia, com a irmã Angela Soldera, coordenadora arquidiocesana da catequese. Esta formação é realizada semanalmente no seminário, mas, eventualmente, os seminaristas terão aulas no centro de pastoral, oportunidade para conhecer os espaço da mitra e as atividades.
A Arquidiocese de Londrina promove, neste final de semana, 27 e 28 de janeiro, uma formação em preparação para a Missa dos Santos Óleos. Também conhecida como Missa Crismal, a Missa dos Santos Óleos é a celebração na qual o arcebispo dom Geremias Steinmetz consagra o óleo do santo crisma e abençoa os óleos dos catecúmenos e dos enfermos que serão utilizados na ministração dos sacramentos em todo o próximo ano nas paróquias e comunidades. Realizada na Semana Santa, será no dia 26 de março, no Ginásio Moringão.
É uma grande celebração que reúne toda a arquidiocese e envolve várias equipes de trabalho, como liturgia, ministros, coroinhas e catequese. Por isso a realização do evento de preparação voltada para coordenadores paroquiais de equipes e toda comunidade interessada.
A formação será ministrada pelo padre Joel Ribeiro Medeiros, assessor arquidiocesano da Liturgia, no Salão João XXIII na Catedral, em dois momentos: no sábado, 27, das 14h às 17h30 e no domingo, das 8h às 11h30. Cada coordenador deve participar de um dos dois dias.
Padre Joel conduzirá o encontro tratando sobre quatro pontos: 1) o celebrar, 2) o símbolo do óleo, 3) o símbolo da luz, e 4) o símbolo da unidade. A partir da formação, os coordenadores são responsáveis por preparar retiros paroquiais para repassar os conteúdos para a comunidade.
“Vou trabalhar um pouco sobre a questão do celebrar e trabalhar três símbolos: o óleo, porque é a Missa dos Santos Óleos; a luz, porque teremos uma preparação para a Vigília Pascal e aquele momento de acender as velinhas no Moringão; e outro sobre a unidade, porque trabalharemos sobre a questão do Sínodo Arquidiocesano, e o Sínodo que está acontecendo também em Roma. São esses quatro pontos”, explicou padre Joel em entrevista à jornalista Renata de Paula, da Rádio Alvorada.
Pascom Arquidiocesana
Foto: Missa dos Santos Óleos de 2023 – Crédito: Guto Honjo
Tomei-me o atrevimento de realizar esta síntese “motivacional” sobre a última carta apostólica do Papa Francisco. Produto de uma primeira leitura que fiz. A riqueza do documento é ímpar. Exige mais de uma semana de leitura e hermenêutica. Como professor do quero contribuir para que nos animemos em fazer a leitura do documento todo. A metodologia é a mnemotécnica. Como muitos de vocês bem o sabem sou Pascaliano e as citações do Papa Francisco sobre Romano Guardini me remetem imediatamente a Blaise Pascal. Digo mais uma vez: A síntese é motivacional para que cada uma e cada um se anime a ler na íntegra e assim aprofundar o texto.
Padre Rafael Solano
“Abandonemos as polêmicas para ouvirmos juntos o que o Espírito Santo diz à Igreja, guardemos a comunhão, continuemos a nos encantar com a beleza da Liturgia”, pede o Papa no final do texto, fazendo certamente uma alusão implícita às numerosas e ainda presentes polêmicas, suscitadas com o motu proprio Traditionis Custodes, que restringe a liturgia em seu rito extraordinário”.
CARTA APOSTÓLICA DESIDERIO DESIDERAVI DO SANTO PADRE FRANCISCO AOS BISPOS, SACERDOTES E DIÁCONOS, AOS HOMENS E MULHERES CONSAGRADOS E AOS LEIGOS FIÉIS SOBRE A FORMAÇÃO LITÚRGICA DO POVO DE DEUS
Introdução. 1. Meus queridos irmãos e irmãs, Com esta carta desejo chegar a todos vocês – depois de ter escrito já apenas aos bispos após a publicação do Motu Proprio Traditionis custodes – e escrevo para compartilhar com vocês algumas reflexões sobre a liturgia, dimensão fundamental para a vida da Igreja . O tema é vasto e merece sempre uma consideração atenta em cada uma das suas vertentes.
A Liturgia: o “hoje” da história da salvação.
2. Desejei ardentemente comer esta páscoa convosco, antes de sofrer”. (Lc 22,15) Estas palavras de Jesus, com as quais se abre o relato da Última Ceia, são a fresta pela qual nos é dada a surpreendente possibilidade de intuir a profundidade do amor das pessoas da Santíssima Trindade por nós.
3. Pedro e João foram enviados para fazer os preparativos para comer aquela Páscoa, mas, na verdade, toda a criação, toda a história – que finalmente estava prestes a se revelar como a história da salvação – foi uma enorme preparação para isso. Neste caso, a desproporção entre a imensidão do dom e a pequenez de quem o recebe é infinita, e não pode deixar de nos surpreender. No entanto, pela misericórdia do Senhor, o dom é confiado aos Apóstolos para que seja levado a cada homem e mulher.
4. Ninguém ganhou um lugar naquela Ceia. Todos foram convidados. Ou melhor dito: todos foram atraídos para lá pelo desejo ardente que Jesus tinha de comer aquela Páscoa com eles.
5. O mundo ainda não sabe, mas todos estão convidados para a ceia das bodas do Cordeiro (Ap 19:9). Para ser admitido na festa, basta o vestido nupcial da fé, que vem da escuta da sua Palavra (cf. Rm 10,17). A Igreja confecciona tal vestimenta para caber em cada um com a brancura de uma vestimenta banhada no sangue do Cordeiro. (Re 7:14).
6. Podemos até não estar cientes disso, mas toda vez que vamos à Missa, a primeira razão é que somos atraídos por seu desejo por nós. De nossa parte, a resposta possível — que é também a ascese mais exigente — é, como sempre, entregar-se a esse amor, deixar-se atrair por ele.
7. Apenas algumas horas depois da Ceia, os apóstolos poderiam ter visto na cruz de Jesus, se pudessem suportar o peso dela, o que significava para Jesus dizer “corpo oferecido”, “sangue derramado”.
8. Não teríamos outra possibilidade de um verdadeiro encontro com ele a não ser o da comunidade que celebra. Por isso a Igreja sempre guardou como seu tesouro mais precioso o mandamento do Senhor: “Fazei isto em memória de mim”.
9. Desde o início a Igreja estava ciente de que não se tratava de uma representação, por mais sagrada que seja, da Ceia do Senhor. Não teria sentido, e ninguém poderia pensar em “encenar” – especialmente diante dos olhos de Maria, a Mãe do Senhor – aquele momento mais alto da vida do Mestre.
A Liturgia: lugar de encontro com Cristo. 10. Aqui reside toda a poderosa beleza da liturgia. Se a ressurreição fosse para nós um conceito, uma ideia, um pensamento; se o Ressuscitado fosse para nós o recolhimento do recolhimento de outros, ainda que autoritários, como, por exemplo, dos Apóstolos; se não nos fosse dada também a possibilidade de um verdadeiro encontro com Ele, isso seria declarar que a novidade do Verbo feito carne se esgotou. 11. A Liturgia nos garante a possibilidade de tal encontro. Para nós, uma vaga lembrança da Última Ceia não adiantaria. Precisamos estar presentes nessa Ceia, para poder ouvir a sua voz, comer o seu Corpo e beber o seu Sangue. Nós precisamos Dele. Não é mágica. 12. A magia é o contrário da lógica dos sacramentos, porque a magia pretende ter um poder sobre Deus, e por isso vem do Tentador. Em perfeita continuidade com a Encarnação, nos é dada, em virtude da presença e ação do Espírito, a possibilidade de morrer e ressuscitar em Cristo. 13. Como é emocionante, como isso acontece. A oração pela bênção da água batismal [3] revela-nos que Deus criou a água precisamente com o Batismo em mente. Isso quer dizer que quando Deus criou a água, ele estava pensando no Batismo de cada um de nós, e este mesmo pensamento o acompanhou em toda a sua atuação na história da salvação, todas as vezes que, com intenção precisa, usou a água para sua obra salvífica. A Igreja: Sacramento do Corpo de Cristo 14. Como nos recordou o Concílio Vaticano II (cf. Sacrosanctum Concilium, n. 5), citando as Escrituras, os Padres e a Liturgia — os pilares da autêntica Tradição — foi do lado de Cristo que dormia o sono da morte sobre a cruz que saiu “o maravilhoso sacramento de toda a Igreja”. [4] O paralelo entre o primeiro Adão e o novo Adão é notável: assim como do lado do primeiro Adão, depois de tê-lo lançado em sono profundo. 15. De fato, há apenas um ato de adoração, perfeito e agradável ao Pai; ou seja, a obediência do Filho, cuja medida é sua morte na cruz. A única possibilidade de poder participar de sua oferta é tornar-se “filhos no Filho”. Este é o presente que recebemos. O sujeito que atua na Liturgia é sempre e somente Cristo-Igreja, o Corpo místico de Cristo.
O sentido teológico da liturgia. 16. Devemos ao Concílio — e ao movimento litúrgico que o precedeu — a redescoberta de uma compreensão teológica da Liturgia e de sua importância na vida da Igreja. Como os princípios gerais enunciados na Sacrosanctum Concilium foram fundamentais para a reforma da liturgia, continuam a ser fundamentais para a promoção dessa celebração plena, consciente, ativa e fecunda (cf. Sacrosanctum Concilium, n. 11; 14). , na liturgia “a fonte primária e indispensável da qual os fiéis devem derivar o verdadeiro espírito cristão” (Sacrosanctum Concilium, 14).
A Liturgia: antídoto para o veneno do mundanismo espiritual. 17. Em diversas ocasiões alertei contra uma perigosa tentação para a vida da Igreja, que chamei de “mundanismo espiritual”. apontando o gnosticismo e o neopelagianismo como duas versões conectadas entre si que alimentam essa mundanidade espiritual. A primeira reduz a fé cristã a um subjetivismo que “em última análise, mantém a pessoa aprisionada em seus próprios pensamentos e sentimentos”. (EG 94) A segunda anula o papel da graça e “conduz a um elitismo narcísico e autoritário, pelo qual, em vez de evangelizar, analisa e classifica os outros, e em vez de abrir a porta à graça, esgota as suas energias em inspecionando e verificando”. (EG 94) Essas formas distorcidas de cristianismo podem ter consequências desastrosas para a vida da igreja. 18. Obviamente, estou falando da Liturgia em seu sentido teológico e certamente não, como Pio XII já afirmou, Liturgia como cerimônias decorativas ou uma mera soma total de leis e preceitos que regem o culto. 19. Se o gnosticismo nos intoxica com o veneno do subjetivismo, a celebração litúrgica nos liberta da prisão de uma autorreferência alimentada pelo próprio raciocínio e pelo próprio sentimento. A ação da celebração não pertence ao indivíduo, mas à Igreja-Cristo, à totalidade dos fiéis unidos em Cristo. A liturgia não diz “eu”, mas “nós”, e qualquer limitação na amplitude desse “nós” é sempre demoníaca. 20. O início de cada celebração me lembra quem eu sou, pedindo-me para confessar meu pecado e convidando-me a implorar a Maria sempre virgem, os anjos e santos e todos os meus irmãos e irmãs que rezem por mim ao Senhor nosso Deus. Certamente, não somos dignos de entrar em sua casa; precisamos de uma palavra dele para sermos salvos. (cf. Mm 8,8) Não temos outra glória senão a cruz de nosso Senhor Jesus Cristo. (cf. Gl 6,14) A liturgia nada tem a ver com um moralismo ascético. É o dom do Mistério Pascal do Senhor que, recebido com docilidade, renova a nossa vida. Não se entra no cenáculo senão pelo poder de atração de seu desejo de comer a Páscoa conosco: Desiderio desideravi hoc Pascha manducare vobiscum, antequam patiar (Lc 22,15).
Redescobrindo diariamente a beleza da verdade da celebração cristã. 21. Mas devemos estar atentos: para que o antídoto da liturgia seja eficaz, somos obrigados a redescobrir todos os dias a beleza da verdade da celebração cristã. Refiro-me mais uma vez ao sentido teológico, como n. 7 da Sacrosanctum Concilium descreve-o tão belamente: a Liturgia é o sacerdócio de Cristo, revelado a nós e dado no seu mistério pascal, tornado presente e ativo por meio de sinais dirigidos aos sentidos (água, óleo, pão, vinho, gestos, palavras), para que o Espírito, mergulhando-nos no mistério pascal, transforme todas as dimensões da nossa vida, conformando-nos cada vez mais a Cristo. 22. Obviamente, o que estou dizendo aqui não quer de modo algum aprovar a atitude oposta, que confunde simplicidade com banalidade descuidada, ou o essencial com superficialidade ignorante, ou a concretude da ação ritual com um funcionalismo prático exasperante. 23. Sejamos claros aqui: todos os aspectos da celebração devem ser cuidadosamente cuidados (espaço, tempo, gestos, palavras, objetos, vestimentas, canto, música…) e todas as rubricas devem ser observadas. Tal atenção bastaria para evitar que se roube da assembléia o que lhe é devido; ou seja, o mistério pascal celebrado de acordo com o ritual que a Igreja estabelece.
Assombro diante do mistério pascal: parte essencial do ato litúrgico. 24. Se nos faltasse o espanto pelo fato de o mistério pascal se tornar presente na concretude dos sinais sacramentais, arriscaríamos verdadeiramente ser impermeáveis ao oceano de graça que inunda cada celebração. Esforços para favorecer uma maior qualidade à celebração, ainda que louváveis, não são suficientes; nem é o apelo a uma interioridade maior. 25. Ainda é verdade que a plenitude da revelação tem, em relação à nossa finitude humana, uma abundância que nos transcende e encontrará sua plenitude no fim dos tempos, quando o Senhor voltar. Mas se o espanto for do tipo certo, não há risco de que a alteridade da presença de Deus não seja percebida, mesmo dentro da proximidade que a Encarnação pretende. Se a reforma eliminou aquele vago “senso de mistério”, então, mais do que motivo para acusações, é mérito seu. A beleza, como a verdade, sempre engendra maravilhas, e quando estas se referem ao mistério de Deus, levam à adoração. 26. A maravilha é parte essencial do ato litúrgico porque é a maneira como aqueles que sabem que estão engajados na particularidade dos gestos simbólicos olham as coisas. É a maravilha de quem experimenta o poder do símbolo, que não consiste em referir-se a algum conceito abstrato, mas em conter e expressar em sua própria concretude o que ele significa.
A necessidade de uma formação litúrgica séria e vital. 27. Portanto, a questão fundamental é esta: como recuperar a capacidade de viver plenamente a ação litúrgica? Esse foi o objetivo da reforma do Conselho. O desafio é extremamente exigente porque as pessoas modernas – não em todas as culturas no mesmo grau – perderam a capacidade de se envolver com a ação simbólica, que é um traço essencial do ato litúrgico. 28. Com a pós-modernidade as pessoas sentem-se ainda mais perdidas, sem referências de qualquer espécie, carentes de valores porque se tornaram indiferentes, completamente órfãs, vivendo uma fragmentação em que um horizonte de sentido parece impossível. E por isso pesa ainda mais a pesada herança que a época anterior nos deixou, consistindo no individualismo e no subjetivismo (que evoca mais uma vez os problemas pelagianos e gnósticos). 29. É com esta realidade do mundo moderno que a Igreja, unida em Concílio, quis entrar em contacto, reafirmando a sua consciência de ser o sacramento de Cristo, a Luz das nações (Lumen gentium), colocando-se em escutando a Palavra de Deus (Dei Verbum) e reconhecendo como suas as alegrias e as esperanças (Gaudium et spes) dos homens do nosso tempo. 30. Nosso espírito, portanto, exulta de verdadeira alegria, pois no caminho que as coisas têm caminhado notamos o respeito a uma justa escala de valores e deveres. Deus deve ocupar o primeiro lugar; a oração a ele é nosso primeiro dever. A liturgia é a primeira fonte de comunhão divina na qual Deus compartilha sua própria vida conosco. (Referência direta a São Paulo VI no encerramento a quarta sessão do concílio Vaticano II). 31. Se a liturgia é “o ápice para o qual se dirige a atividade da Igreja e, ao mesmo tempo, a fonte de onde brota todo o seu poder” (Sacrosanctum Concilium, 10), então podemos compreender o que está em jogo. aposta na questão litúrgica. Seria trivial ler as tensões, infelizmente presentes em torno da celebração, como uma simples divergência entre diferentes gostos em relação a uma determinada forma ritual. A problemática é principalmente eclesiológica. Não vejo como é possível dizer que se reconheça a validade do Concílio – embora me surpreenda que um católico ouse não fazê-lo – e ao mesmo tempo não aceitar a reforma litúrgica nascida da Sacrosanctum Concilium, uma documento que expressa a realidade da Liturgia intimamente ligada à visão de Igreja tão admiravelmente descrita na Lumen gentium. 32. Voltemos ao cenáculo em Jerusalém. Na manhã de Pentecostes nasce a Igreja, célula inicial da nova humanidade. Somente a comunidade de homens e mulheres – reconciliados porque perdoados, vivos porque Ele está vivo, verdadeiros porque habitados pelo Espírito da verdade. 33. Sabemos que só graças à graça deste encontro o ser humano se torna plenamente humano. Só a Igreja de Pentecostes pode conceber o ser humano como pessoa, aberta a uma relação plena com Deus, com a criação e com os irmãos. 34. Nisto se coloca a questão decisiva da formação litúrgica. Romano Guardini diz: “Aqui também é indicada a primeira tarefa prática: levados por essa transformação interior de nosso tempo, devemos aprender de novo a nos relacionar religiosamente como seres plenamente humanos”. [8] É isso que a Liturgia torna possível. Para isso devemos ser formados. Guardini não hesita em declarar que sem formação litúrgica “então as reformas rituais e textuais não ajudarão muito”. [9] Não pretendo tratar aqui de forma exaustiva o riquíssimo tema da formação litúrgica. 35. Era e é necessário encontrar os canais para uma formação que é o estudo da Liturgia. Desde o início do movimento litúrgico muito se fez neste sentido, com preciosas contribuições de estudiosos e instituições acadêmicas. No entanto, é importante agora difundir este conhecimento para além do ambiente acadêmico, de forma acessível, para que cada fiel cresça no conhecimento do sentido teológico da Liturgia. Esta é a questão decisiva e fundamenta todo tipo de entendimento e toda prática litúrgica. 36. Os ministros ordenados realizam uma ação pastoral de primeira importância quando pegam pela mão os fiéis batizados para conduzi-los à repetida experiência do mistério pascal. Recordemos sempre que é a Igreja, o Corpo de Cristo, que é o sujeito celebrante e não apenas o sacerdote. O tipo de conhecimento que vem do estudo é apenas o primeiro passo para poder entrar no mistério celebrado. Obviamente, para poder conduzir os irmãos e irmãs, os ministros que presidem à assembleia devem conhecer o caminho, conhecê-lo por tê-lo estudado no mapa de seus estudos teológicos, mas também por ter frequentado a liturgia na prática real de uma experiência de fé viva, alimentada pela oração — e certamente não apenas como uma obrigação a ser cumprida. 37. Um plano litúrgico-sapiencial de estudos na formação teológica dos seminários certamente teria efeitos positivos na ação pastoral. Não há aspecto da vida eclesial que não encontre seu ápice e sua fonte na Liturgia. Mais do que o resultado de programas elaborados, uma pastoral abrangente, orgânica e integrada é consequência de colocar a Eucaristia dominical, fundamento da comunhão, no centro da vida da comunidade. A compreensão teológica da Liturgia não permite de modo algum que essas palavras sejam entendidas como reduzir tudo ao aspecto do culto. Não é autêntica uma celebração que não evangeliza, assim como não é autêntica uma proclamação que não conduz ao encontro com o Ressuscitado na celebração. 38. Tanto para os ministros como para todos os baptizados, a formação litúrgica neste primeiro sentido não é algo que se possa adquirir de uma vez por todas. Uma vez que o dom do mistério celebrado ultrapassa a nossa capacidade de o conhecer, este esforço deve certamente acompanhar a formação permanente de todos, com a humildade dos pequeninos, a atitude que se abre ao espanto. 39. Somente a ação do Espírito pode completar nosso conhecimento do mistério de Deus, pois o mistério de Deus não é uma questão de algo apreendido mentalmente, mas uma relação que toca toda a vida. Tal experiência é fundamental para que, uma vez que os seminaristas se tornem ministros ordenados, possam acompanhar as comunidades no mesmo caminho de conhecimento do mistério de Deus, que é o mistério do amor. 40. Esta última consideração nos leva a refletir sobre o segundo sentido que podemos entender na expressão “formação litúrgica”. Refiro-me à nossa formação, cada um segundo a sua vocação, a partir da participação na celebração litúrgica. Mesmo o conhecimento que advém dos estudos, dos quais acabei de falar, para não se tornar uma espécie de racionalismo, deve servir para realizar a ação formativa da própria Liturgia em cada crente em Cristo. 41. A plena extensão da nossa formação é a nossa conformação a Cristo. Repito: não tem a ver com um processo mental abstrato, mas com tornar-se Ele. Este é o propósito para o qual é dado o Espírito, cuja ação é sempre e somente confeccionar o Corpo de Cristo. É assim com o pão eucarístico, e com cada um dos batizados chamados a tornar-se cada vez mais aquilo que foi recebido como dom no Batismo; ou seja, ser um membro do Corpo de Cristo. Leão Magno escreve: “Nossa participação no Corpo e Sangue de Cristo não tem outro fim senão tornar-nos aquilo que comemos”. 42. A Liturgia é feita com coisas que são exatamente o oposto das abstrações espirituais: pão, vinho, óleo, água, fragrâncias, fogo, cinzas, pedra, tecidos, cores, corpo, palavras, sons, silêncios, gestos, espaço, movimento, ação , ordem, tempo, luz. Toda a criação é uma manifestação do amor de Deus, e desde quando esse mesmo amor se manifestou em sua plenitude na cruz de Jesus, toda a criação foi atraída para ela. É toda a criação que é assumida para ser colocada a serviço do encontro com o Verbo: encarnado, crucificado, morto, ressuscitado, ascendido ao Pai. 43. A liturgia dá glória a Deus não porque podemos acrescentar algo à beleza da luz inacessível em que Deus habita (cf. 1Tm 6,16). Tampouco podemos acrescentar à perfeição do canto angélico que ressoa eternamente pelos lugares celestiais. A liturgia dá glória a Deus porque nos permite – aqui, na terra – ver Deus na celebração dos mistérios, e ao vê-lo tirar vida da sua Páscoa. 44. Guardini escreve: “Aqui se delineia a primeira tarefa do trabalho de formação litúrgica: o homem deve tornar-se novamente capaz de símbolos”. [13] Esta é uma responsabilidade de todos, tanto dos ministros ordenados como dos fiéis. A tarefa não é fácil porque o homem moderno se tornou analfabeto, não consegue mais ler símbolos; é quase como se nem sequer se suspeitasse de sua existência. Isso acontece também com o símbolo do nosso corpo. 45. Sabemos bem que a celebração dos sacramentos, pela graça de Deus, é eficaz em si mesma (ex opere operato), mas isso não garante o pleno engajamento das pessoas sem uma forma adequada de se colocarem em relação à linguagem da a celebração. Uma “leitura” simbólica não é um conhecimento mental, nem a aquisição de conceitos, mas sim uma experiência viva. 46. Se as coisas criadas são uma parte tão fundamental e essencial da ação sacramental que traz nossa salvação, então devemos nos organizar em sua presença com um olhar renovado, não superficial, respeitoso e agradecido. Desde o início, as coisas criadas contêm a semente da graça santificante dos sacramentos. 47. Ainda pensando em como a Liturgia nos forma, outra questão decisiva é a educação necessária para poder adquirir a atitude interior que nos permitirá usar e compreender os símbolos litúrgicos. Deixe-me expressá-lo de uma forma simples. 48. Tenho em mente os pais, ou mais talvez os avós, mas também os nossos pastores e catequistas. Muitos de nós aprendemos com eles o poder dos gestos da liturgia, como, por exemplo, o sinal da cruz, o ajoelhar-se, as fórmulas da nossa fé. Talvez não tenhamos uma memória real de tal aprendizado, mas podemos facilmente imaginar o gesto de uma mão maior pegando a mãozinha de uma criança e acompanhando-a lentamente no traçado pelo corpo pela primeira vez o sinal de nossa salvação. As palavras acompanham o movimento, estas também ditas lentamente, quase como se quisessem tomar posse de cada instante do gesto, tomar posse de todo o corpo: “Em nome do Pai… e do Filho… e do Espírito Santo …. Um homem.” E então a mão da criança é deixada sozinha, e é observada repetindo tudo sozinha, com ajuda pronta por perto, se necessário. Mas esse gesto fica agora consignado, como um hábito que crescerá com Ele, dando-lhe um sentido que só o Espírito sabe fazer. A partir desse momento esse gesto, a sua força simbólica, é nosso, pertence-nos; ou melhor, pertencemos a ela.
Ars celebrandi. 49. Então, é preciso saber como o Espírito Santo age em cada celebração. A arte de celebrar deve estar em harmonia com a ação do Espírito. Só assim estará livre dos subjetivismos que são fruto dos gostos individuais dominantes. Só assim estará livre da invasão de elementos culturais que são assumidos sem discernimento e que nada têm a ver com uma correta compreensão da inculturação.Finalmente, é preciso compreender a dinâmica da linguagem simbólica, sua natureza particular, sua eficácia. 50. O verdadeiro artista não possui uma arte, mas é possuído por ela. Não se aprende a arte de celebrar frequentando um curso de oratória ou de técnicas de comunicação persuasivas. (Não estou julgando intenções, apenas observando efeitos.) Toda ferramenta pode ser útil, mas deve estar a serviço da natureza da Liturgia e da ação do Espírito Santo. É necessária uma dedicação diligente à celebração, permitindo que a própria celebração nos transmita a sua arte. Guardini escreve: “Devemos entender quão profundamente permanecemos entrincheirados no individualismo e no subjetivismo, quão desacostumados nos tornamos às demandas dos ‘grandes’ e quão pequenos são os parâmetros de nossa vida religiosa. 51. Penso em todos os gestos e palavras que pertencem à assembléia: reunir-se, andar cuidadoso em procissão, estar sentado, de pé, ajoelhar-se, cantar, ficar em silêncio, aclamações, olhar, ouvir. Há muitas maneiras pelas quais a assembléia, como um corpo, (Ne 8:1) participa da celebração. Todos juntos fazendo o mesmo gesto, todos falando juntos em uma só voz — isso transmite a cada indivíduo a energia de toda a assembléia. É uma uniformidade que não apenas não amortece, mas, ao contrário, educa os crentes individuais para descobrir a singularidade autêntica de suas personalidades não em atitudes individualistas, mas na consciência de ser um só corpo. Não se trata de seguir um livro de etiqueta litúrgica. Trata-se, antes, de uma “disciplina” — no sentido a que Guardini se referiu — que, se observada autenticamente, nos forma. São gestos e palavras que colocam ordem no nosso mundo interior fazendo-nos viver certos sentimentos, atitudes, comportamentos. 52. Entre os atos rituais que pertencem a toda assembléia, o silêncio ocupa um lugar de absoluta importância. Muitas vezes é expressamente prescrito nas rubricas. Toda a celebração eucarística está imersa no silêncio que precede o seu início e que marca cada momento do seu desenrolar ritual. De fato, está presente no ato penitencial, depois do convite “Rezemos”, na Liturgia da Palavra (antes das leituras, entre as leituras e depois da homilia), na oração eucarística, depois da comunhão. [16] Tal silêncio não é um refúgio interior para se esconder em algum tipo de isolamento íntimo, como se deixasse para trás a forma ritual como uma distração. Esse tipo de silêncio contrariaria a própria essência da celebração. O silêncio litúrgico é algo muito mais grandioso: é símbolo da presença e da ação do Espírito Santo que anima toda a ação da celebração. 53. É sempre o mesmo gesto que, em essência, declara nosso próprio ser pequeno na presença de Deus. No entanto, feito em diferentes momentos de nossa vida, molda nossas profundezas internas e depois se mostra externamente em nossa relação com Deus e com nossos irmãos e irmãs. Também ajoelhar-se deve ser feito com arte, ou seja, com plena consciência do seu sentido simbólico e da necessidade que temos deste gesto para expressar o nosso modo de estar na presença do Senhor. 54. Se é verdade que a ars celebrandi é exigida de toda assembléia que celebra, também é verdade que os ministros ordenados devem ter uma solicitude muito particular por ela. Ao visitar as comunidades cristãs, notei que a sua forma de viver a celebração litúrgica está condicionada – para melhor ou, infelizmente, para pior – pela forma como o seu pároco preside à assembleia. Poderíamos dizer que existem diferentes “modelos” de presidência. 55. Haveria muito mais a dizer sobre a importância de presidir e os cuidados que requer. Em diversas ocasiões me detive no exigente dever de pregar a homilia. [17] Limito-me aqui a várias outras considerações amplas, querendo sempre reflectir convosco sobre como somos formados pela Liturgia. Penso no ritmo regular da Missa dominical em nossas comunidades e, portanto, dirijo-me aos sacerdotes, mas implicitamente a todos os ministros ordenados. 56. O sacerdote vive sua participação característica na celebração em virtude do dom recebido no sacramento da Ordem, e isso se expressa precisamente na presidência. Como todas as funções que ele é chamado a desempenhar, este não é principalmente um dever que lhe é atribuído pela comunidade, mas sim uma consequência do derramamento do Espírito Santo recebido na ordenação que o capacita para tal tarefa. O sacerdote também é formado por ele presidir à assembléia celebrante. 57. O próprio sacerdote deve ser dominado por este desejo de comunhão que o Senhor tem para com cada pessoa. É como se estivesse colocado no meio entre o coração ardente de amor de Jesus e o coração de cada um dos fiéis, que é o objeto do amor do Senhor. Presidir à Eucaristia é mergulhar na fornalha do amor de Deus. Quando nos for dado compreender esta realidade, ou mesmo apenas intuir algo dela, certamente já não precisaríamos de um Diretório que imponha o devido comportamento. Se temos necessidade disso, então é por causa da dureza de nossos corações. 58. Quando a primeira comunidade partiu o pão, obedecendo ao mandamento do Senhor, fê-lo sob o olhar de Maria que acompanhou os primeiros passos da Igreja: «todos estes continuaram unânimes em oração com as mulheres e Maria, mãe de Jesus .” (At 1,14) A Virgem Mãe “guarda” os gestos de seu Filho confiados aos Apóstolos. Assim como ela protegeu o Verbo feito carne em seu seio depois de receber as palavras do anjo Gabriel, ela protege mais uma vez no seio da Igreja aqueles gestos que formam o corpo de seu Filho. 59. Tornados instrumentos para acender o fogo do amor do Senhor na terra, protegidos no seio de Maria, Virgem feita Igreja (como cantou São Francisco sobre ela) os sacerdotes devem permitir que o Espírito Santo aja sobre eles, para completar o trabalho que ele começou neles em sua ordenação. A ação do Espírito oferece-lhes a possibilidade de exercer o seu ministério de presidir à assembleia eucarística com o temor de Pedro, consciente de ser pecador (Lc 5,1-11), com a poderosa humildade do servo sofredor (cf. 42ss), com o desejo de “ser comido” pelas pessoas que lhes são confiadas no exercício quotidiano do ministério. 60. Não é, repito, uma adesão mental, mesmo que toda a nossa mente, bem como toda a nossa sensibilidade, devam estar engajadas nela. Assim, o sacerdote se forma presidindo as palavras e os gestos que a Liturgia coloca em seus lábios e em suas mãos. Ele não está sentado em um trono [18] porque o Senhor reina com a humildade de quem serve. 61. Nesta carta quis simplesmente partilhar algumas reflexões que certamente não esgotam o imenso tesouro da celebração dos santos mistérios. Peço a todos os bispos, sacerdotes e diáconos, aos formadores dos seminários, aos instrutores das faculdades teológicas e escolas de teologia, e a todos os catequistas que ajudem o santo povo de Deus a tirar daquilo que é a primeira fonte da espiritualidade cristã. Somos chamados continuamente a redescobrir a riqueza dos princípios gerais expostos nos primeiros números da Sacrosanctum Concilium, captando o vínculo íntimo entre esta primeira das constituições conciliares e todas as outras. Por isso não podemos voltar àquela forma ritual que os padres conciliares, cum Petro et sub Petro, sentiram a necessidade de reformar, aprovando, sob a orientação do Espírito Santo e seguindo sua consciência de pastores, os princípios dos quais nasceram a reforma. 62. Gostaria que esta carta nos ajudasse a reavivar nossa admiração pela beleza da verdade da celebração cristã, a nos lembrar da necessidade de uma autêntica formação litúrgica e a reconhecer a importância de uma arte de celebrar que está em o serviço da verdade do mistério pascal e da participação de todos os batizados nele, cada um segundo a sua vocação. 63. Para isso, desejo deixar-lhes mais uma indicação para seguir em nosso caminho. Convido-vos a redescobrir o sentido do ano litúrgico e do Dia do Senhor. Ambos também nos foram deixados pelo Conselho. (Cf. Sacrosanctum Concilium, nn. 102-111). 64. À luz de tudo o que dissemos acima, vemos que o ano litúrgico é para nós a possibilidade de crescer no conhecimento do mistério de Cristo, mergulhando a nossa vida no mistério da sua morte e ressurreição, aguardando o seu regresso na glória. Esta é uma verdadeira formação permanente. Nossa vida não é uma série caótica de eventos aleatórios, um após o outro. 65. À medida que avança o tempo renovado pelo mistério da sua morte e ressurreição, a cada oitavo dia a Igreja celebra no dia do Senhor o acontecimento da nossa salvação. O domingo, antes de ser um preceito, é um dom que Deus faz ao seu povo; e por isso a Igreja o protege com um preceito. A celebração dominical oferece à comunidade cristã a possibilidade de ser formada pela Eucaristia. De domingo a domingo, a palavra do Ressuscitado ilumina a nossa existência, querendo realizar em nós o fim para o qual foi enviada. (Cf. Is 55,10-11) De domingo a domingo a comunhão no Corpo e Sangue de Cristo quer fazer também da nossa vida um sacrifício agradável ao Pai, na comunhão fraterna da partilha, da hospitalidade, do serviço.
Na live de hoje, o arcebispo dom Geremias Steinmetz conversa sobre Liturgia e Espiritualidade com os representantes arquidiocesanos da Pastoral Litúrgica: padre Joel Ribeiro Medeiros, assessor eclesiástico, e Márcia Luciene Goretti Tresse, coordenadora.
“Eles eram perseverantes (…) na fração do pão e nas orações” (At 2, 42)
A Pastoral Familiar da Arquidiocese de Londrina convida para a formação sobre liturgia voltada para celebração de casamentos e metodologia a ser trabalhada nas formações de noivos no dia 7 de março, sábado, às 13h30, no Centro de Pastoral Jesus Bom Pastor.
O terceiro domingo do Tempo Comum, celebrado no próximo dia 26 de janeiro, será o primeiro Domingo da Palavra de Deus, instituído pelo Papa Francisco com a recente Carta Apostólica, na forma de Motu Proprio, Aperuit illis: “É bom que não venha jamais a faltar na vida do nosso povo esta relação decisiva com a Palavra viva, que o Senhor nunca Se cansa de dirigir à sua Esposa, para que esta possa crescer no amor e no testemunho da fé”, escreveu Francisco, que às 10 horas (horário italiano) presidirá a Santa Missa na Basílica de São Pedro, com transmissão do Vatican News com comentários em português. Ao final da Celebração Eucarística, o Santo Padre entregará uma particular edição da Bíblia aos fiéis presentes.
Dom Cristiano Sousa OSB Cam*, monge Beneditino da Congregação de Camaldoli, nos propõe uma reflexão sobre esta iniciativa do Santo Padre:
“O Domingo da Palavra de Deus, instituído pelo Papa Francisco, em sua Carta Apostólica sob forma de Motu Proprio Aperuit Illis, de 30 de setembro de 2019, reassume todo um percurso de maturação que a Igreja fez nos últimos séculos, tendo como expressão a Constituição Dogmática Dei Verbum, do Concílio Vaticano II, publicado em 18 de novembro de 1965. Não podemos esquecer a Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, ocorrido em Roma em outubro de 2008, que frutificou na Exortação Apostólica pós sinodal Verbum Domini, do Papa Bento XVI (30 de setembro de 2010).
Como bem sublinha o Papa Francisco, ao concluir sua Carta Apostólica, “Possa o domingo dedicado à Palavra fazer crescer no povo de Deus uma religiosa e assídua familiaridade com as sagradas Escrituras, tal como ensinava o autor sagrado já nos tempos antigos: ‘esta palavra «está muito perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a praticares’ (Dt 30, 14).”
A assídua familiaridade com o Santa Palavra não é um acréscimo virtuoso imposto à vida espiritual ou um comportamento a ser instalado com finalidade sobrenatural. Mas é, antes de tudo e acima de tudo, a substância e a identidade de cada cristã e de cada cristão.
Com a inserção temática na Liturgia do III Domingo do Tempo Comum, a Palavra de Deus é evidenciada em modo celebrativo/comunitário, em todo o orbe cristão, com abertura e acolhimento às diversas igrejas, também as provenientes da Reforma do Século XVI e com toda a Ortodoxia. Abre-se também ao já percorrido caminho de Dialogo Hebraico – Cristão.
“Portanto estabeleço que o III Domingo do Tempo Comum seja dedicado à celebração, reflexão e divulgação da Palavra de Deus. Este Domingo da Palavra de Deus colocar-se-á, assim, num momento propício daquele período do ano em que somos convidados a reforçar os laços com os judeus e a rezar pela unidade dos cristãos. Não se trata de mera coincidência temporal: a celebração do Domingo da Palavra de Deus expressa uma valência ecumênica, porque a Sagrada Escritura indica, a quantos se colocam à sua escuta, o caminho a seguir para se chegar a uma unidade autêntica e sólida. (APERUIT ILLIS, Papa FRANCISCO, n. 3).”
Essa celebração, fruto de muita reflexão do Magistério Universal (Pastores, ministros, teólogos e todo o Povo de Deus), é uma manifestação propícia, com o fim de fortalecer e recuperar a identidade cristã, que se consolida no processo de “familiarização” com a Palavra de Deus. E para isso, a dimensão celebrativa só pode ser frutuosa se for o cume e fonte de uma vida “frequentada na Sagrada Escritura”, cuja “Sacramentalidade” (Bento XVI, Verbum Domini, 56) nos motiva à uma “Primazia da Palavra”, qualquer que seja nosso status, nossas escolhas e nosso cotidiano.
A história foi testemunha de muitos desacertos e desentendimentos entre os fiéis. Muitas vezes, o Texto Sagrado, foi instrumentalizado e reduzido, seja para fundamentar as ideologias, seja também para mera apologética. Também hoje nos confrontamos com uma “utilização” supersticiosa e moralista da Santa Palavra, subordinando-a às fantasias individuais e coletivas, e até mesmo – com triste e indignada constatação – com o objetivo de domínio político, econômico e social.
Quando a vida não é alicerçada, alimentada e iluminada pela Palavra, cuja “Primazia” é fundamental, incorremos nos mesmos erros que a história ainda nos narra, e que se encontram presentes em nossa sociedade. Isso alerta para a distância em que podemos estar daquela nossa verdadeira identidade, que se realiza e se concretiza justamente na “assiduidade” à Sagrada Escritura. Por isso, essa jornada é um forte convite à Lectio Divina, que no Brasil, foi nominada como “Leitura Orante da Bíblia”, e muito frutificou nas Comunidades Eclesiais de Base.
A “Lectio” não é apenas um exercício de piedade, ou “momento de oração” para obter graças, curas, etc … Também não é tempo no qual o leitor busca seus interesses pessoais e tenta encontrá-los na Bíblia. Antes de tudo, a “Lectio” é uma decisão entre duas pessoas que fizeram uma “Aliança”, um “Pacto de Amor”: Deus e o homem. E nessa leitura, homem e Deus se encontram no percurso escolhido em plena liberdade por ambos, em que a Palavra proferida e a Palavra escutada, vai assumindo carne e presença em uma nova historia, a “Historia da Salvação”.
Mesmo desenvolvida em um contexto monástico, a Lectio Divina não é privilégio de monges e monjas. Na experiência de Fé, o cristão que frequenta a Palavra, vai exprimindo a Imagem de Deus que lhe foi impressa no Batismo, pois, quando duas pessoas se amam e se “encontram” nesse dialogo de ternura – próprio da leitura orante – inexoravelmente se adquire aquela palavra de conhecimento experiencial, que Platão (400 a.C) chamava de syggeneia, isto é, conaturalidade ou consanguinidade, pois somente os semelhante conhece o semelhante. É esse o fruto da Lectio! Pela continua frequentação á Palavra Santa, nós nos tornamos conaturais de Deus, do mesmo modo que Ele se conaturalizou conosco.
O “Grande” Papa e Doutor São Gregório (séc. VI), em seus escritos, nos permite confirmar essa realidade com uma máxima de muito valor para os que decidiram percorrer o caminho fundamental da Lectio: “Divina eloquia legente crescunt”. “A Palavra de Deus cresce junto com quem dela se aproxima”. Aquele Jesus que se esconde e se revela no texto bíblico, é o “Grande Amigo”, melhor, o “Noivo” que vai desvelando gradualmente à sua amada os seus mais ricos tesouros, impulsionando-a delicadamente, no pleno respeito da sua liberdade, a aderir à sua proposta de amor.
O “Domingo da Palavra de Deus”, celebrado pela primeira vez em nossas comunidades religiosas e paroquiais, quer ser sinal e apelo para redescobrirmos nossa identidade de discípulos e discípulas de Jesus, homens e mulheres que escolheram o “Primado” da Palavra de Deus, que é sempre transformadora, restauradora e vivificadora de cada ser humano e de toda a sociedade “Quem se alimenta dia a dia da Palavra de Deus torna-se, como Jesus, contemporâneo das pessoas que encontra; não se sente tentado a cair em nostalgias estéreis do passado, nem em utopias desencarnadas relativas ao futuro.” (APERUIT ILLIS, Papa FRANCISCO, n.12)”.
* Dom Cristiano Sousa OSB Camé monge Beneditino da Congregação de Camaldoli, natural de Guaratinguetá –SP e membro da Comunidade do Mosteiro de São Gregório al Celio, Roma. Formado em Sacra Teologia pelo Pontificio Ateneo Santo Anselmo de Roma, atualmente é mestrando em Psicologia Clinica pela LUMSA-Roma.
Além dos tempos litúrgicos que possuem características próprias, como é o caso do Advento, Natal, Quaresma ou Páscoa, existem trinta e três ou trinta e quatro semanas durante o curso do ano nas quais não se celebram aspectos particulares do mistério de Cristo. Nelas o mistério é venerado em sua globalidade, especialmente nos domingos. Este é chamado de “tempus per annum” ou Tempo Comum.
Julian Lopez Martin diz muito bem que estamos diante de “um tempo importante, tão importante que, sem ele, a celebração do mistério de Cristo e a sua progressiva assimilação pelos cristãos seriam reduzidas a episódios isolados, ao invés de impregnar toda a existência dos fiéis e das comunidades”.
É um tempo indispensável que desenvolve o mistério pascal de modo progressivo e profundo. Dar atenção unicamente aos “tempos fortes” significa esquecer que o ano litúrgico consiste na celebração, com sagrada lembrança no curso de um ano, de todo o mistério de Cristo e da obra da salvação. O Tempo Comum começa na segunda-feira que segue o domingo após o dia 6 de janeiro e se estende até a terça-feira antes da Quaresma. Retoma na segunda-feira depois de Pentecostes e termina nas Vésperas do primeiro domingo do Advento.
Neste longo período do ano litúrgico devemos prestar especial atenção às leituras tanto dos domingos como dos dias de semana. É o tempo em que a comunidade cristã aprofunda na fé o mistério pascal e sublinha as exigências da vida cristã. A liturgia é, antes de tudo, culto santificante, todavia contém rica instrução e ensino ao Povo de Deus, para a qual é importantíssima a leitura da Sagrada Escritura.
O Concílio Vaticano II estabeleceu que houvesse nas celebrações litúrgicas uma mais abundante, variada e mais adequada leitura da Bíblia (cf SC 24,33,35). A recuperação da leitura da maior parte dos livros da Sagrada Escritura acontece durante o Tempo Comum. O anúncio da Palavra é parte integrante da liturgia de todos os sacramentos para dar mais leveza e agilidade a toda a vida cristã em contínua conversão. É realmente muito rico e profundo o esquema com o qual a Igreja anuncia o Mistério de Cristo na sua liturgia. Assim o cristão, de ano em ano vai vivendo e aprofundando a sua fé. A Liturgia lhe permite a perseverança na fé e o esclarecimento e fundamentação da sua esperança.
Neste período, deve ser lembrado e cultivado o sentido do domingo como Páscoa semanal e dia da assembleia. A leitura semi contínua dos evangelhos sinóticos permite, através da homilia, uma profunda educação à fé, fundada na teologia das atividades históricas de Jesus, como é apresentada pela narrativa de cada evangelista. É preciso estar muito atento a esse aspecto, para ajudar os fiéis a perceberem, de domingo em domingo, a continuidade da narrativa evangélica e fazer com que aflore a característica da mensagem de cada evangelista ao apresentar o mistério de Cristo.
Além disso, não se deverá esquecer a referência ao texto do Antigo Testamento, cuja escolha é sempre determinada pelo texto do Evangelho. Os textos bíblicos anunciados na liturgia que caracterizam os anos A, B e C são testemunho da consciência de um itinerário de amadurecimento na Igreja primitiva. Percorrer este caminho significa ir em direção a uma consciência plena da vontade de Deus, “com toda sabedoria e inteligência espiritual” (Cl 1,10), também para as nossas assembleias dominicais. Assim o cristão, de ano em ano vai vivendo e aprofundando a sua fé. A Liturgia lhe permite a perseverança na fé e o esclarecimento e fundamentação da sua esperança.
Dom Geremias Steinmetz Arcebispo Metropolitano de Londrina
As Equipes de Liturgia e de Animação do 14º Intereclesial das CEBs já estão em Londrina-PR para vivenciarem e organizarem os detalhes que envolvem a preparação das Celebrações do encontro. Para tanto, nesta manhã de Domingo (21/01), após a oração do Ofício Divino das Comunidades juntamente com os membros da Equipe Ampliada Nacional, os responsáveis pelas Equipes reuniram-se para apresentar o que têm preparado e revisar o roteiro da Celebração de Abertura.
Em entrevista com Padre Dirceu Fumagalli, coordenador das Equipes de Serviço do Intereclesial, e Irmã Penha Carpanedo, assessora da Equipe de Liturgia, foram apresentadas a mística, a motivação e as perspectivas que envolvem as Celebrações do encontro, em especial os quatro grandes momentos celebrativos: Celebração de Abertura, Celebração da Palavra nas Comunidades, Celebração dos Mártires e Defensores da Vida, e Celebração de Encerramento e Envio.
Celebrar nas praças a cultura do encontro
Os espaços utilizados pelo Intereclesial foram denominados como Praças e cada uma delas nomeada com uma das árvores nativas do Brasil e, segundo o Padre Dirceu: “a praça é a centralidade do urbanismo, a centralidade do debate por isso nos reunimos na praça, debaixo das árvores que é lugar de encontro, lugar de falar de Deus, da caminhada e tomar decisões sobre o que vamos refletir.”. Referindo-se à Praça do Ipê (Praça da Bíblia), local onde será realizada a Celebração de Abertura no dia 23, afirmou que será “o lugar do encontro das pessoas e das comunidades, é a chegada, o abraço, a acolhida…”.
A Celebração da Palavra nas Comunidades, a ser realizada junto com as famílias hospedeiras nas Paróquias na quarta-feira (24), traz a raiz da identidade e espiritualidade da vivência das CEBs com a Palavra de Deus como fonte, ponto de unidade e orientação da caminhada. Os momentos de oração na Grande Plenária do Ginásio Moringão, denominada Praça da Araucária, serão assumidos pelas grandes regiões do Oestão, Nordestão e Nortão.
Já a Celebração dos Mártires e Defensores da Vida acontecerá no Aterro do Lago Igapó, nomeado Praça da Seringueira, onde o fio condutor será a memória daqueles/as que deram a vida na construção do Reino de Deus e de uma sociedade justa. A Celebração de Encerramento e Envio, na noite do sábado (27), será realizada no Moringão que se tornará a Praça da Peroba Rosa. “É a partilha! Nos encontramos em torno da Palavra que nos ilumina, lembrando que aqueles que nos antecederam ainda caminham com a gente, e assim partilhamos!”, disse Pe. Dirceu.
O caminho de preparação da Liturgia do 14º Intereclesial
Ao longo dos últimos três anos, a partir do trabalho da Ampliada Nacional e do Secretariado, a Equipe de Liturgia foi sendo composta e estruturou o seu trabalho através de Seminários Nacionais e vivências com a presença de representantes dos Regionais, sendo assessorados pela Rede de Animação Litúrgica, CELEBRA.
Irmã Penha Carpanedo conta como está organizada a equipe e os trabalhos: “A sequência da liturgia está dentro da sequência do encontro, e cada dia é uma celebração coordenada pelas Grandes Regiões. Foram três anos de organização: Um seminário e um encontro com a presença dos regionais, seguido de vários encontros maiores e diversas oficinas locais. E a Rede Celebra está como assessoria da liturgia do 14º Intereclesial, pois a Rede nasceu da necessidade das CEBs, a partir da preparação do 8º Encontro, em Santa Maria-RS. Na ocasião, a Equipe de Liturgia reunia-se diariamente para refletir sobre as Celebrações das Comunidades e grandes encontros, e como eles podem ser inspiradores para a vida litúrgica das Comunidades no seu dia a dia. Portanto, a Rede Celebra expressa a espiritualidade das CEBs.”, disse.
Elson Matias e Gleice Francisca Equipe de Comunicação
Nos dias 4 e 5 de novembro aconteceu na Paróquia Sagrados Corações o Curso de Formação Litúrgica ministrado pelo pároco Pe. Mauro Pedrinelli. O objetivo foi de buscar a unidade nas celebrações Eucarísticas conforme a Sacrosanctum Concilium.
Em entrevista concedida ao www.portaldascebs.org.br em outubro de 2016, após participar do Seminário de Liturgia em Preparação ao Intereclesial, Celso Pinto Carias, assessor das CEBs do Brasil, fala sobre a importância da Liturgia para a vida das comunidades e da preparação da Liturgia do 14º Intereclesial das CEBs
Qual a importância da liturgia na vida das comunidades?
A liturgia é o Ofício Divino, isto é, o trabalho de louvor junto com Deus. O ser humano é um ser eminentemente simbólico. O Rito faz parte da vida. Assim sendo, as comunidades também procuram, a partir de sua espiritualidade e caminhada, expressar sua fé e vida pela liturgia. É muito importante que assim aconteça, pois o rito faz a memória do Caminho e nele encontramos o sinal antecipado da plenitude que se pode viver no aqui e agora. Há na experiência das Comunidades Eclesiais de Base uma grande sensibilidade simbólica, mas que ainda está procurando ser aprimorada.
O que mais chamou sua atenção neste seminário de liturgia em preparação ao 14º Intereclesial?
Minha presença no seminário foi de ajudar a refletir sobre o caminho eclesiológico que as CEBs vêm fazendo. A liturgia se dá a partir deste chão. Neste sentido, percebi que a maioria dos participantes, se não todos, estavam sintonizados com a necessidade de encontrar um caminho litúrgico em comunhão com a Igreja, mas que, ao mesmo tempo, fosse reflexo da tradição das CEBs e da realidade urbana em que estamos vivendo.
Quais foram as indicações dos/as participantes do seminário para as celebrações do 14o. Interclesial?
Na verdade o seminário nos ofereceu orientações gerais. Questões de fundo que devem nortear o conjunto das celebrações. Por exemplo: as celebrações ecumênicas. Elas devem ser pensadas de forma mais participativa e, se for caso, até rever o modelo que tem sido proposto nos encontros. Outra questão é a unidade ritual e a criatividade. Muitas vezes a “criatividade” acaba desvalorizando o rito.
Quais suas impressões sobre o processo de preparação do 14º Intereclesial partindo do que viu em Londrina nestes dias?
Celso Carias: A Arquidiocese de Londrina está tomando o processo como muito afinco. Certamente muito há por fazer. Todos nós devemos ajudar Londrina a realizar este encontro. Existe um certo atraso, porém há indicações que tudo será resolvido.
Você gostaria de acrescentar algo?
Acrescento aqui algo muito pessoal. Estou convencido que de precisamos fazer uma avaliação profunda da caminhada das CEBs e, nesta, a questão litúrgica tem lugar. Não sou liturgista, mas percebo que nos falta, muitas vezes, uma melhor compreensão do papel dos ritos e da necessidade de métodos que possam ser replicados com mais facilidade nas comunidades, e não apenas em grandes encontros. Creio, neste sentido, que a REDE CELEBRA, muito nos pode ajudar.