Vivemos uma nova realidade: a pandemia do Covid-19. Há mais de seis meses uma necessidade surgiu: o distanciamento físico entre as pessoas para a preservação da vida. Com isso, novos formatos de celebrações e eventos foram sendo implementados, como as missas on-line, formações e momentos de oração pela internet. Alguns sacramentos e a catequese foram postergados, sonhos foram adiados, planos foram mudados. Mas, é ainda possível ser missionário neste momento tão desafiante de isolamento social?
Outubro é o mês missionário por excelência. Missão é sempre sair de si e ir em direção ao outro, anunciando Jesus Cristo. Papa Francisco nos chama a atenção constantemente para que sejamos uma Igreja em Saída. Mas como sair, quando somos chamados a ficar em casa? A alternativa é o areópago digital, espaço agora das “lives” no Facebook e Instagram, das reuniões no Google Meet, no Zoom e outras ferramentas que eram prioritariamente usadas no mundo dos negócios ou da educação e que passaram a ser território também de bispos, padres, leigos e leigas, portanto, território de missão!
Neste tempo pandêmico, as pessoas ficam muito mais tempo em casa e, portanto, têm mais tempo livre para acessar os meios de comunicação disponíveis em suas residências, seja TV, rádio ou internet. Assim como as formas de consumo de bens em geral estão mudando consideravelmente nesses últimos meses, a mudança no consumo de informação não poderia ser diferente e precisamos estar atentos a esta oportunidade de evangelização. Ainda que nenhum dos sacramentos possam efetivamente ser recebidos de forma virtual e, na medida do possível, respeitando todas as medidas sanitárias, eles precisam ser buscados fisicamente. Porém, há uma dificuldade para a preparação presencial do povo de Deus para o recebimento dos mesmos. Há ainda impossibilidade para visitação de famílias, idosos, crianças e adolescentes para realizar essa missão presencial. Assim, a internet continua sendo apontada como uma alternativa viável!
Sempre muito pastoral, em sua nova Encíclica “Fratelli Tutti”, “Todos Irmãos” lançada no último dia 4 de outubro, em Assis, Itália, Papa Francisco nos exorta pela busca da fraternidade e da amizade social. Transcrevemos aqui o primeiro ponto do documento:“‘FRATELLI TUTTI’: escrevia São Francisco de Assis, dirigindo-se a seus irmãos e irmãs para lhes propor uma forma de vida com sabor a Evangelho. Destes conselhos, quero destacar o convite a um amor que ultrapassa as barreiras da geografia e do espaço; nele declara feliz quem ama o outro, ‘o seu irmão, tanto quando está longe, como quando está junto de si’. Com poucas e simples palavras, explicou o essencial duma fraternidade aberta, que permite reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas independentemente da sua proximidade física, do ponto da terra onde cada uma nasceu ou habita”. Com esta exortação, o Papa Francisco nos convida a buscarmos a criatividade por meio do Espírito Santo para amar o irmão de perto ou de longe em tempos de pandemia e assim realizarmos a missão de encontrar Jesus no próximo!
Com a trágica crise dos últimos meses, a economia, jogos políticos e interesses escusos têm estado acima da dignidade humana. Com a correria histérica que vivíamos, a pandemia do COVID-19 fez-nos parar um pouco. Por vezes já estávamos bastante insensíveis com o sofrimento do outro, tomando como corriqueiro os fatos degradantes de nossa sociedade. Muitas pessoas isoladas pela pandemia estão confinadas em suas casas ou outros que nem casa têm, sofrem mais ainda nas ruas. Um bonito trabalho unindo a Arquidiocese de Londrina por meio da Cáritas e a Secretaria de Assistência Social de Londrina está sendo realizado desde o início da pandemia, acolhendo moradores em situação de rua nas diversas casas de retiro da arquidiocese, dando dignidade a esses irmãos e irmãs já fragilizados. Isso é um ato concreto de missão.
No que tange ainda à internet, de forma muito lúcida, o Sumo Pontífice, nos alerta para os perigos da onda digital no número 71 da Fratelli Tutti: “Entretanto os movimentos digitais de ódio e destruição não constituem – como alguns pretendem fazer crer – uma ótima forma de mútua ajuda, mas meras associações contra um inimigo. Além disso, ‘os meios de comunicação digitais podem expor ao risco de dependência, isolamento e perda progressiva de contato com a realidade concreta, dificultando o desenvolvimento de relações interpessoais autênticas’. Fazem falta gestos físicos, expressões do rosto, silêncios, linguagem corpórea e até o perfume, o tremor das mãos, o rubor, a transpiração, porque tudo isso fala e faz parte da comunicação humana. As relações digitais, que dispensam da fadiga de cultivar uma amizade, uma reciprocidade estável e até um consenso que amadurece com o tempo, têm aparência de sociabilidade, mas não constroem verdadeiramente um ‘nós’; na verdade, habitualmente dissimulam e ampliam o mesmo individualismo que se manifesta na xenofobia e no desprezo dos frágeis. A conexão digital não basta para lançar pontes, não é capaz de unir a humanidade”. Sendo assim, na medida do possível, respeitando as leis impostas para a preservação da saúde, precisamos, pouco a pouco, retomar o contato missionário físico, participar dos sacramentos, insistir no olho-no-olho, afinal o ser humano é relacional, e precisa disso para alcançar sua sanidade mental, física e espiritual.
Com equilíbrio, em tempos de pandemia, não podemos deixar de ser missionários. Um telefonema (tão raro hoje em tempos de WhatsApp), uma mensagem de conforto, um pão feito em casa, um pedaço de bolo, uma oração feita de coração, enfim, tudo que estiver ao nosso alcance, pode ser feito pelo nosso próximo e com certeza agradará o coração de Deus. Portanto, invoquemos o Espírito Santo para que sejamos: irmãos todos missionários.
Jefferson Bassetto
Seminarista da teologia da Arquidiocese de Londrina