O Evangelho que vai ser proclamado no próximo domingo convida-nos a fazer do Reino de Deus nossa prioridade de vida. Qualquer outro valor deve passar para segundo plano, diante deste “tesouro” ou desta “pérola de grande valor” que é o Reino de Deus.
Para compreendermos melhor o que Jesus quer nos ensinar, parece-me importante aprofundar o que realmente significa a expressão “Reino de Deus.
No tempo de Jesus a expectativa do Reino de Deus era muito viva, por isso na sua interpretação, havia diversas correntes de opinião. A novidade de Jesus consistiu em dizer que o Reino de Deus já havia chegado e que não se identificava com nenhuma opinião em voga naquela época. Não foi fácil para Jesus propor um novo significado para a expressão “Reino de Deus” e fazer com que o povo e os discípulos compreendessem que se tratava de algo muito mais profundo, que exigia conversão das pessoas e transformação radical da sociedade, no sentido do amor a amigos e inimigos e da superação de todos os elementos contrários ao ser humano e a Deus.
Para os zelotas que eram nacionalistas e muitos discípulos influenciados por eles a proposta de Jesus foi uma decepção. “Nós esperávamos que fosse ele quem iria restaurar Israel” (Lc 24,21). No entanto, o Reino de Deus não se identifica com nenhum tipo de nacionalismo.
O Reino, segundo a pregação de Jesus, também não se equipara às descrições fantásticas dos apocalípticos sobre o fim do mundo. Jesus discorda ainda dos fariseus que pensavam apressar o advento do Reino com a observância minuciosa da Lei.
Segundo Jesus, não basta fazer o que a Lei ordena. A presente ordem das coisas não pode salvar o ser humano de sua alienação fundamental. Os que se negaram ir ao banquete de núpcias do filho do rei, negaram-se por motivos socialmente justos, e, em nada infligiram a lei. No entanto, foram excluídos do Reino.
Para participar do Reino de Deus exige-se o amor que não é objeto de legislação (Mt 21,14; Lc 14,16-24). Por isso os marginalizados da ordem vigente estão mais próximos do Reino do que os que se consideram em ordem.
Jesus se opõe também ao pensamento dos essênios que reduziam o Reino aos bens espirituais e se retiravam do mundo, para esperar, sem nada fazer, além das abluções rituais, a reconciliação universal. Não bastam as purificações rituais. O advento do Reino se faz através da conversão e da oposição, não da fuga, ao projeto deste mundo.
Segundo Leonardo Boff, o Reino de Deus, é a manifestação definitiva do poder de Deus sobre o mundo dominado pelas forças satânicas e a restauração de toda a criação com o aparecimento de novos céus e novas terras. É vida com Deus, perdão dos pecados e futuro feliz. É uma nova ordem do mundo, onde Deus é tudo em todas as coisas. Não é premio para os piedosos e castigo para os pecadores. Antes, pelo contrário, é boa nova para os pecadores e para todos que se convertem. É historização da utopia fundamental da humanidade, concretização de um mundo totalmente reconciliado, libertado de tudo o que oprime e purificado de todos os males. É mais que bem estar social, mais que qualquer avanço no domínio da natureza que venha em benefício da sociedade. O Reino não se identifica com nada deste mundo, nem mesmo com a Igreja.
Na oração do Pai Nosso pedimos: “venha a nós o vosso Reino”. Na raiz desta súplica está uma atitude de fundamental esperança. Pela esperança se atualiza o futuro e se proclama que o Reino “já” está presente na história ou pode se fazer presente, ao mesmo tempo que se confessa que “ainda não” alcançou sua plenitude e precisa ser instaurado.
A instauração do Reino exige conversão, ou como fala o Evangelho do próximo domingo, exige que “se venda tudo” para adquiri-lo.
Dom Manoel João Francisco
Administrador Apostólico da Arquidiocese de Londrina
Bispo Diocesano de Cornélio Procópio