Paulo de Tarso é, sem dúvida, depois de Jesus Cristo, uma das figuras mais fascinantes do cristianismo primitivo, um verdadeiro homem de Deus, profundamente comprometido com a missão de levar a mensagem do Evangelho a todas as nações. Passou por uma profunda conversão, era um fariseu zeloso e não media esforços para perseguir aqueles que não cumpriam a Lei Mosaica. A caminho de Damasco sua soberba caiu por terra e ele ouviu a voz do Ressuscitado! Que experiência maravilhosa Paulo deve ter vivido! Inevitavelmente, se transformou no maior propagador do evangelho. De perseguidor dos cristãos, tornou-se pastor de almas.


Apesar de Paulo não estar sozinho em sua ação missionária, pois tinha ao seu lado grandes defensores do cristianismo, como Barnabé, Priscila e Áquila, Tito, Timóteo, Silas, Lídia, Pedro, é dele a grande responsabilidade de ser o mais lúcido defensor da abertura da Igreja ao mundo pagão. Como diz o escritor Giuseppe Barbaglio, em seu livro (As Cartas de Paulo I), esse personagem incrível do cristianismo não era um intelectual, nem um pensador, ou grande escritor, no sentido clássico, mas sua atividade literária foi fundamental para a propagação do evangelho e para a formação das primeiras comunidades cristãs.

Saulo, o fariseu
Saulo, era natural de Tarso, na Cilícia, filho de comerciantes ricos, fariseu, aluno do célebre rabino Gamaliel, era cidadão romano e por ser um zeloso defensor da Torá, perseguia os cristãos, pois considerava os seguidores de Cristo traidores do Judaísmo. Para esse zeloso guardião das tradições judaica e farisaica esses cristãos tinham abandonado a Lei Mosaica, portanto, Saulo assumiu uma atitude agressiva em relação aos cristãos. Na Carta aos Gálatas Paulo escreve: “Ouvistes certamente da minha conduta de outrora no judaísmo, de como perseguia sobremaneira e devastava a Igreja de Deus e como progredia no judaísmo mais que muitos compatriotas da minha idade, distinguindo-me no zelo pelas tradições paternas” (Gl 1,13-14).


Saulo, o convertido
A caminho de Damasco e com a missão de prender cristãos, inclusive com carta de recomendação do sumo sacerdote para cometer tal ato, o arrogante perseguidor literalmente “cai do cavalo”. Vindo abaixo com seu orgulho e com seu rosto em terra, ouve a voz do Senhor que lhe dizia: “Saul, Saul, por que me persegues?” (At 9,4). Essa narrativa dramática e edificante narrada em Atos dos Apóstolos nos mostra que o Senhor resgata para o seu ministério até o seu pior inimigo. Saulo cometia atrocidades com os cristãos, mas era um homem culto, falava grego, latim e hebraico e Deus se valeu de sua inteligência e ortodoxia para que Paulo pregasse e convertesse a muitos. “Cair do cavalo” significou para o até então fariseu, cair da sua soberba e se transformar em um instrumento evangelizador nas mãos do Senhor.

Paulo, o missionário, o pastor de almas
Para entender Paulo e sua paixão pela evangelização, podemos utilizar uma metáfora que ilustra muito bem sua missão. O próprio Paulo, em 1 Coríntios, compara sua a vida após a conversão como aqueles que correm no estádio: “Não sabeis que aqueles que correm no estádio, correm todos, mas um só ganha o prêmio? Os atletas correm para ganhar um coroa perecível, os cristãos para ganharem uma coroa imperecível” (1 Cor 9,24-25). Paulo se coloca como exemplo de um verdadeiro atleta, aquele que precisa ser extremamente disciplinado para ser merecedor do prêmio. Paulo se via como um instrumento de uma missão divina, seu propósito transcendia interesses pessoais, a motivação por trás de suas palavras: “Não fui eu que me dei a mim mesmo esta missão, mas foi Deus que me confiou” (1 Cor 9,16), deixa nos muito claro sua convicção. Frederick Fyvie Bruce, renomado estudioso do Novo Testamento, em (Paulo, o Apóstolo do Coração Livre), afirma que nosso personagem era, acima de tudo, um homem de princípios inabaláveis e sua paixão pela evangelização vinha de uma profunda convicção espiritual. Ainda, segundo José Comblin, em (A Teologia da Missão de Paulo), o apóstolo entendia que a verdadeira fé cristã não era apenas uma questão de crença pessoal, mas também de prática comunitária.

Em nossas comunidades como podemos seguir o exemplo de Paulo?
A prática pastoral inspirada em Paulo exige líderes servidores, que escutem, orientem e cuidem da comunidade, promovendo a união e a construção de pontes. Assim como Paulo, somos chamados a viver uma fé que una, a solidariedade, a justiça e o compromisso com a verdade de Cristo, a fé exige ação, cuidado com o próximo e uma esperança concreta em um futuro de redenção.


O gesto misericordioso de Deus
Ao final da nossa reflexão, recomendamos que leiam a Carta aos Efésios, encontraremos ali uma verdadeira reflexão sobre o pensamento paulino. Com sua fé firme e uma convicção sólida na mensagem que queria transmitir que era a crença na salvação vinda de Cristo, sua vida foi marcada por uma missão divina de cuidar de suas comunidades e de viver em esperança, mesmo diante das dificuldades. Se, em alguns momentos, sua postura parecia radical, isso se devia à força de sua convicção em Cristo. No entanto, sua mensagem ainda hoje é muito clara: o cristianismo verdadeiro não se vive de forma isolada, mas em comunidade, com amor, serviço e um compromisso profundo com o próximo, onde todas pessoas são convidadas na fé, a fazer parte da aliança. Se Paulo não viu Jesus, mas ouviu o Cristo, a sua experiência com o Ressuscitado não demonstra nenhum mérito vindo dele, mas do grande gesto misericordioso de Deus que o resgatou do domínio das trevas.

André Santiago, Diego da Silva Biondaro, Evandra Ranieri e Silvio Neuhaus
Estudantes do 4º período do curso de Teologia da PUCPR – Campus Londrina

Artigo produzido para a disciplina Cartas Paulinas, ministrada pelo professor Fabrízio Zandonadi Catenassi

Na Solenidade dos Santos Pedro e Paulo, Francisco exortou os fiéis a se inspirarem nos Apóstolos para crescer como Igreja do seguimento, humilde, que nunca dá por terminada a busca do Senhor e encontra a sua alegria no anúncio do Evangelho ao mundo

Seguimento e anúncio: estas foram as duas palavras ressaltadas pelo Papa na homilia da Solenidade dos Santos Pedro e Paulo, festejada neste 29 de junho. No Brasil, a data foi transferida para o próximo domingo, 2 de julho.

Na Basílica de São Pedro, concelebraram com o Pontífice os 32 arcebispos nomeados no ano passado. Na Basílica, como é tradição, também estava presente uma delegação do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla. A Santa Sé retribui o gesto fraterno, enviando um representante na Festa de Santo André, em 30 de novembro, padroeiro da Igreja local.

Já em sua homilia, Francisco se inspirou na pergunta que Jesus dirige aos discípulos, contida no Evangelho de Mateus: “Vós, quem dizeis que Eu sou?” (Mt 16, 15). Para o Pontífice, esta é a pergunta fundamental, a mais importante: Quem é Jesus para mim?

Seguimento

Os dois Apóstolos responderam a esta pergunta de modo diferente. A resposta de Pedro poderia se resumir em uma palavra: seguimento. Pedro largou tudo para ir atrás do Senhor. E o Evangelho sublinha que foi “imediatamente”, não disse a Jesus que iria pensar, fazer cálculos para ver se lhe convinha, não apresentou desculpas para adiar a decisão, mas deixou as redes e O seguiu. Haveria de descobrir tudo dia após dia, no seguimento de Jesus.

Aquela anotação “imediatamente”, acrescentou o Papa, vale também para nós: se há tantas coisas na vida que podemos adiar, o seguimento de Jesus não pode ser uma delas. E atenção! Pois algumas desculpas aparecem disfarçadas de espiritualidade, como “não sou digno”, “não sou capaz”. Para Francisco, são artimanhas do diabo, que nos rouba a confiança na graça de Deus. A lição de Pedro, portanto, é: devemos nos desprender de nossas seguranças terrenas, imediatamente, e seguir Jesus todos os dias. 

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Já a resposta de Paulo se resume na palavra anúncio. No caminho de Damasco, Jesus foi ao seu encontro e cegou-o com a sua luz, ou melhor, graças àquela luz, Saulo deu-se conta de quanto era cego. Assim, consagra a sua vida a percorrer terra e mar, cidades e aldeias, para anunciar Jesus Cristo.

Portanto, à pergunta “quem é Jesus para mim”, Paulo não responde com uma religiosidade intimista, mas com a inquietação de levar o Evangelho aos outros. Também hoje, observou o Papa, a Igreja tem necessidade de colocar o anúncio no centro, que não se cansa de repetir: “Ai de mim se eu não evangelizar”. Uma Igreja que precisa anunciar como necessita de oxigênio para respirar.

Francisco exortou os fiéis a se inspirarem nos Apóstolos Pedro e Paulo para crescer como Igreja do seguimento, como Igreja humilde que nunca dá por terminada a busca do Senhor, tornando-se simultaneamente uma Igreja aberta, que encontra a sua alegria não nas coisas do mundo, mas no anúncio do Evangelho ao mundo.

Dirigindo-se aos arcebispos que recebem o Pálio, pede que sejam apóstolos como Pedro e Paulo, discípulos no seguimento e apóstolos no anúncio. Por fim, o Pontífice saudou a Delegação do Patriarcado Ecumênico de Constantinopla, enviada por Bartolomeu. “Obrigado pela presença! Caminhemos juntos, no seguimento e no anúncio da Palavra, crescendo na fraternidade. Que Pedro e Paulo nos acompanhem e intercedam por nós.”

Bianca Fraccalvieri
Vatican News

Foto: Reprodução Vatican Media

No dia 25 de janeiro a Igreja celebra a conversão de São Paulo, apóstolo que expressou com força e profundidade únicas o mistério da redenção. Sua influência para a Igreja de Cristo detalha a novidade do Evangelho do Senhor

Desde a época do Desterro (séc. VI a.C.), o povo judeu sofreu uma série de acontecimentos que ocasionaram uma grande dispersão de seus membros (conhecido como diáspora). Por este motivo, no século I, haviam comunidades judaicas em quase todas as cidades importantes de todo o Império Romano. Esses judeus nasceram e cresceram longe seu ambiente natural, integraram o modo de pensar dos lugares nos quais estavam,de modo a adquirir uma mentalidade mais tolerante e enriquecida. Na grande maioria dos casos, as comunidades se mantinham fiéis ao seu monoteísmo, reunindo-se ao redor das sinagogas e procurando viver os costumes e falando a sua língua original, ao menos na liturgia. Os judeus sofreram assim forte influência do mundo helenístico sem perder suas tradições e sem renunciar a sua própria fé e cultura.

Foi neste contexto que São Paulo nasceu, entre o 5º e o 10º ano da era cristã, na cidade de Tarso, atual Turquia, morrendo em Roma no ano de 67 d.C. Seus pais eram judeus exilados de Jerusalém a Tarso.Tarso foi a capital da província romana da Cilícia, estando na rota que unia a Síria à Anatólia, importante na atividade comercial da época. Tarso também foi o centro de uma escola filosófica do estoicismo. Saulo foi seu nome judeu e Paulo era seu nome greco-romano. Turco e culturalmente grego, com cidadania romana, foi influenciado pelas culturas grega, judaica e romana.

A Turquia na época havia deixado de ser colônia grega para ser colônia romana. Cidades como Tarso sofreram grande influência do mundo helenístico, tal como a cidade de Alexandria no Egito, que por produzir uma profunda fusão entre a cultura helênica e a mentalidade judaica, gerou como fruto a tradução para o grego da Sagrada Escritura chamada tradução dos “LXX”. São Paulo pertenceu ao grupo dos fariseus, judeus que desfrutavam do favor do povo pelo seu rigor e autoridade quanto à Lei.

Estes judeus procuravam se ater estritamente às prescrições da Lei de Moisés, que o outro grupo contrário, o dos saduceus, interpretavam de modo mais relaxado. A conduta dos fariseus não se ajustava somente à Torá senão também a todos os ensinamentos dos sábios rabinos. Muitos rabinos ou mestres das Escrituras são chamados no Evangelho de “escribas” ou “doutores da Lei”. 

São Paulo afirma ser filho de pais judeus e descendente da tribo de Benjamim:

circuncidado ao oitavo dia, da raça de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu e filho de hebreus. Quanto à Lei, fariseu” (Cfr. Filipenses 3,4-8).

Foi formado para ser um rabino. Na sua adolescência foi enviado a Jerusalém para receber instrução, lugar em que estudou com o famoso rabino Gamaliel[1]: Continuou ele:

‘Eu sou judeu, nasci em Tarso da Cilícia, mas criei-me nesta cidade, instruí-me aos pés de Gamaliel, em toda a observância da lei de nossos pais, partidário entusiasta da causa de Deus como todos vós também o sois no dia de hoje’(Cfr. Atos 22, 3).

Viveu rigorosamente como um fariseu, observante da lei. São Paulo teve uma educação superior em comparação à humilde formação dos apóstolos pescadores. Aprendeu também um oficio manual: Eram fabricantes de tendas (Cfr. Atos 18,3), com o qual podia ganhar a sua vida, como era costume entre os judeus. Costurava lonas para tendas, conheceu o funcionamento do comércio e das redes de transportes de seu tempo.

Assim como São Paulo nasceu e cresceu durante a diáspora, da diáspora também eram os judeus aos quais ele pregou, como por exemplo, os habitantes de Atenas, Corinto, Éfeso e Roma.

Ele possuía uma sólida formação tanto na área filosófica, como teológica, jurídica, mercantil e linguística. Falava grego, latim, hebraico e aramaico, o que facilitou pregar o evangelho com exemplos e comparações comuns aos povos destas culturas. Viajou como missionário pela Grécia, Ásia Menor, Síria e Palestina. Possuiu um grande perfil humano que elevado pela vocação recebida fortaleceu-se pela sua grandiosa personalidade espiritual.

A relação de São Paulo com Jesus

São Paulo não chegou a conhecer Jesus durante a sua vida pública e não pertenceu ao círculo dos doze apóstolos. Bento XVI, em respeito a isso, afirma que só com o coração se conhece verdadeiramente a uma pessoa. É assim que São Paulo conheceu a Cristo, com o coração, e deste modo é que se conhece a pessoa em sua verdade e, em um segundo momento nos seus detalhes.

Tudo o que ele nos transmitiu em seus escritos, não foi fruto do testemunho ocular, senão da transmissão que ele mesmo recebeu:

Eu vos transmiti primeiramente o que eu mesmo havia recebido: que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras (Cfr. 1 Cor 15,3).

Como Jesus, São Paulo também pregou a mensagem do Evangelho nas sinagogas: Imediatamente começou a proclamar pelas sinagogas que Jesus é o Filho de Deus (Cfr. Atos 9, 20).

São Paulo até então tinha sido um dos principais perseguidores da dita seita judaica dos seguidores de Jesus, considerada herética pelo judaísmo.

Outro fator importante de sua formação apostólica e espiritual é o fato dele ter recebido diretamente de Cristo uma missão específica, por meio de experiências espirituais e revelações pessoais.

Segundo o livro dos Atos dos Apóstolos o encontro de São Paulo com Cristo foi de repente. Depois de ter recebido poderes do Sumo Sacerdote para perseguir aos cristãos, encontrou-se com Cristo no caminho de Damasco. O relato está escrito em Atos (9, 1-19) e descreve o momento como uma teofania, pois se vê envolvido por uma luz, cai no chão e escuta uma voz do céu com a qual dialoga. Na sua conversão intervém Jesus, seus companheiros e depois Ananias. São Paulo responde com a oração e o jejum, purificação prévia ao seu batismo. A luz de Cristo transformou toda a sua vida e forma de pensar: ficou cego, e como havia permanecido na escuridão, restaurou a visão graças a essa nova iluminação.

O apóstolo se atribui como servo de Cristo e sublinha muitas vezes que é apóstolo “por vontade” de Deus e de Cristo:

Paulo, servo de Jesus Cristo, escolhido para ser apóstolo, reservado para anunciar o Evangelho de Deus (cfr. Rom 1,1).

Ainda que não formasse parte do círculo dos doze apóstolos, foi chamado por Jesus ressuscitado, considerando-se como “o menor dos apóstolos”:

Porque eu sou o menor dos apóstolos, e não sou digno de ser chamado apóstolo, porque persegui a Igreja de Deus. (Cfr. 1 Cor 15,9). 

Na carta aos Coríntios é onde São Paulo desenvolve mais detalhadamente seu direito a ser chamado apóstolo, sem desmerecer em nada aos demais:

São ministros de Cristo? Falo como menos sábio: eu, ainda mais. (Cfr. 2 Cor 11, 23).

Ensinamentos

Nos seus ensinamentos São Paulo identifica que todo homem busca a felicidade eterna, a visão beatífica de Deus, porém antes de se unir à Cristo se sente afastado, experimenta os desejos da carne, do corpo de morte, do pecado. Isso se deve ao pecado original feito por Adão, porém Cristo veio nos resgatar, como nos diz:

Assim como em Adão todos morrem, assim em Cristo todos reviverão (Cfr. 1 Cor 15, 22).

Todos nós cristãos devemos viver pela fé que temos em Cristo, identificarmo-nos inteiramente com Ele:

Eu vivo, mas já não sou eu; é Cristo que vive em mim. (Cfr. Gál. 2, 20).

São Paulo sublinha também a importância do amor e da unidade. Por meio do Espírito Santo que nos deu, Deus derramou o seu amor nos nossos corações (Cfr. Rom 5,5). Por definição o amor é aquele que une, o Espírito é quem gera a comunhão na Igreja: é a força da coesão que mantém unidos os fiéis ao Pai por Cristo, e atrai aos que ainda não gozam da plena comunhão. O Espírito Santo guia a Igreja até a unidade.Assim, nós cristãos somos chamados a evitar a divisões:

Rogo-vos, irmãos, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo, que todos estejais em pleno acordo e que não haja entre vós divisões. Vivei em boa harmonia, no mesmo espírito e no mesmo sentimento(Cfr. 1 Cor 1, 10), para assim podermos ser um.

A oração do Senhor – para que todos sejam um – é para nós a melhor promessa de união com Deus e unidade entre nós homens. Devemos conservar a unidade do Espírito Santo com o vínculo da paz:

Sede solícitos em conservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. (Cfr. Efe 4, 1-3).

Após o seu encontro com Deus, São Paulo também se encontrou com a sua cruz. Este encontro permitiu a ele, assim como hoje permite a todo cristão, ser convidado a sair do seu próprio eu a entregar-se confiadamente Àquele que se entregou por nós.

São Paulo suportou dificuldades e tribulações por amor à Cristo. Contudo, todo o esforço e sucesso pelos quais atravessou não lhe levaram à ostentação. Sabia que a lógica humana não servia para explicar as realidades da graça. Deus sabe buscar os instrumentos mais frágeis para que apareça com maior evidência que a obra é Dele e não dos homens. Jesus constitui o fundamento e o centro do seu anúncio e pregação, porque em Cristo encontramos o ponto culminante da história da salvação.

Vemos nos escritos de São Paulo que o homem é justificado pela graça de Deus e não por buscar a salvação com as próprias forças. A iniciativa da nossa salvação depende exclusivamente de Deus e não somente dos nossos méritos. Em sua vida vemos que ele era um estrito observante da lei como todo fariseu, cumprindo-a nos mínimos detalhes. Foi no momento do seu encontro pessoal com Deus, ao perseguir os seus seguidores, que se vê como pecador, e é a partir daí que ele passará a abandonar-se na graça dada por meio de Jesus Cristo.

Como perseguidor dos cristãos, participou e consentiu com a lapidação de Santo Estevão:

E Saulo havia aprovado a morte de Estêvão (…); Saulo, porém, devastava a Igreja (…) (Cfr. Atos 8, 1;3),

considerado como o primeiro mártir da Igreja Católica. Teve como médico permanente a São Lucas, que foi evangelista e depois bispo.

Depois de ter saído da comunidade judaica e de ter sido perseguidor dos primeiros cristãos por heresia e apostasia, também foi expulso e perseguido pelos mesmos motivos. Foi considerado herege por sustentar os dogmas e opiniões diferentes à ortodoxia da religião judaica. Seu Deus único passou a ser Uno-e-Trino: Pai, Filho e Espírito Santo. Sua apostasia consistiu em negar as crenças judaicas e declarar-se um converso seguidor de Cristo.

Importância

Sua importância para o cristianismo pode ser referida em dois importantes pontos chaves: pela superação do judaísmo e pela relevância na revelação dada por Cristo da teologia da salvação.

Na mensagem de Jesus a superação do judaísmo já havia resultado claro, como podemos ver com o episódio de Pentecostes. Porém, foi São Paulo quem difundiu a pregação da Palavra de Deus (Cristo) entre os pagãos. Mesmo sabendo outras línguas, escreveu todas as suas cartas em grego, língua mais falada na época, para que todo o mundo civilizado até aquele momento pudesse entendê-lo. A decisão de escrever em grego supôs cortar com a tradição religiosa judaica de que as Sagradas Escrituras só podia ser lida em hebraico. Esse foi o modo que ele encontrou para se dirigir aos gentios, pois tinha a clara convicção de haver sido eleito por Jesus para a missão de anunciar o evangelho ao mundo pagão (helenístico), assim como Pedro havia recebido a missão de anunciar aos judeus. São Paulo supera o judaísmo ao não fazer distinção entre os batizados quanto às suas origens e laços civis:

Já não há judeu nem grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vós sois um em Cristo Jesus. (Cfr. Gál 3, 28).

Um dos seus grandes feitos foi permitir que não somente os judeus, mas também os conversos de outras religiões e povos, tornassem cristãos sem a necessidade da circuncisão e da prática de outros ritos judaicos.

Por outro lado, vemos a relevância na revelação dada por Cristo da teologia da salvação. São Paulo expõe como Cristo é a centralidade da nossa salvação. Cristo é a cabeça, da qual nós cristãos, por meio de Cristo, somos elevados e unidos a Cristo à categoria de filhos do Pai:

A prova de que sois filhos é que Deus enviou aos vossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai!’, já não és escravo, mas filho. E, se és filho, então também herdeiro por Deus (Cfr. Gál, 4, 6-7).

São Paulo foi um missionário viajante e se destacou também pelos seus discursos. Em uma de suas viagens missionárias pela península grega, na cidade de Atenas, fez o seu famoso discurso no Areópago. Neste lugar ele entrou em contato com os grupos dos maiores intelectuais da época. O areópago naquela época funcionava como um fórum cultural. Ao falar do Deus desconhecido dos filósofos, supôs que os filósofos tinham alguma noção de Deus. Esta ideia foio núcleo que mais tarde afirmaria a doutrina da possibilidade dos homens conhecer racionalmente a existência de Deus:

Desde a criação do mundo, as perfeições invisíveis de Deus, o seu sempiterno poder e divindade, se tornam visíveis à inteligência, por suas obras; de modo que não se podem escusar (Cfr. Rom 1, 20).

Dos 27 livros do Novo Testamento, 14 são atribuídos a São Paulo e desde os primórdios foram transmitidos como uma coleção de catorze cartas ou de treze mais uma, a carta aos Hebreus. Por mais que se apresentem estudos que questionem a autenticidade de São Paulo quanto à autoria direta de suas cartas, todas são consideradas inspiradas e canônicas pela Igreja, ou seja, são textos que o Espírito Santo inspirou, escreveu e reservou como guia para a sua Igreja. Podemos dividi-las em três blocos: as cartas dirigidas a igrejas particulares (Romanos,Gálatas, Efésios, Filipenses, Colossenses, as duas aos Tessalonicenses e as duas aos Coríntios), depois as dirigidas a pessoas individuais (Tito e Filêmon e as duas a Timóteo) e, por último a carta dirigida aos hebreus. Há possibilidade de dividi-las quanto às suas características literárias (conteúdo ou propriedades similares): as grandes cartas (ROM, 1 COR, 2 COR, GÁL), cartas aos Tessalonicenses (1TES, 2 TES), cartas do cativeiro (FILP, FILM, COL, EFE), cartas pastorais (1 TIM, 2 TIM, TIT) e a carta aos hebreus (HEB).

Vê-se com a múltipla formação étnica, geográfica e cultural, São Paulo conseguiu trabalhar pela unidade e a universalidade, a unidade “católica” dos que creem. O gênero literário das cartas se apresenta como uma novidade absoluta em termos de literatura universal. E ninguém antes que ele, havia conseguido expressar com igual força e profundidade o mistério da redenção. Não podemos esquecer que esta profundidade de doutrina é devida sobretudo à novidade do Evangelho de Cristo, não como algo independente.

[1]Rabino que deu o famoso conselho na reunião do Sanedrim (Atos 5, 33-42) em que se discutia matar os apóstolos para evitar a contaminação com a nova doutrina. Com seu conselho salvou os apóstolos da morte naquele momento. Atualmente seu corpo encontra-se na Catedral de Pisa na Itália.

Rodrigo José Nascimento
Seminarista da Arquidiocese de Londrina