Reflexão de um professor de teologia moral sobre as agressões a vida e a dignidade da pessoa humana.

 

O ser humano, dotado de razão tem a capacidade de interpretar, analisar e compreender os fatos que acontecem ao seu redor. Cada criatura humana foi agraciada pelo Criador com o dom da liberdade para que o pudesse procurar e aderindo livremente a Ele, “chegasse a uma plena e feliz perfeição”. CIC, 1730.

Elementos de vital importância são colocados no Catecismo da Igreja Católica no artigo terceiro quando se aborda o tema da liberdade do homem. De fato na medida em que optamos pelo bem a nossa liberdade vai amadurecendo e possibilitando a realização não só de atos bons, como também desenvolvendo em nós a capacidade de fortalecer a nossa vontade; em outras palavras quanto mais praticamos o bem, muito mais nos tornamos livres.

Um dos maiores atentados na atualidade contra a moralidade da pessoa humana é nada mais nem nada menos que o uso e abuso do consenso.

Isso mesmo, o consenso extrapolou os limites do pensamento e como uma audaz e forte representação da mitologia grega; este ingressou na vida familiar, eclesial e social da nossa época.

O consenso se assemelha ao deus grego Hybris. O seu ponto de partida é o sentimentalismo desmedido misturado com uma falsa piedade que na verdade deriva de um agir pusilânime e anacrônico. Se o homem é livre e pode agir com liberdade o consenso tornou-se uma espécie de capsula onde os diversos poderes da sociedade albergam sua medíocre maneira de optar e do qual se aproveitam para dominar e aniquilar quaisquer tipo de exigência, luta ou capacidade de sacrifício. Hybris preferiu o caminho da arrogância para assim viver isolado e distante da verdade.

O consenso hoje passou a ser para muitos norma do agir moral diante de qualquer tipo de ato, e sobre tudo para qualquer decisão. De fato; aquilo que é decidido no consenso pode chegar a se transformar numa verdade moral mesmo que as consequências sejam funestas.

Situações como aquelas que vivemos constantemente, produto de uma sociedade que se afiança no sentimentalismo e na produção de seres cada vez mais sentimentais nos levam a perceber que a verdade moral tornou-se desconhecida e claro; incomoda para aqueles que simplesmente a negam ou a descartam. Por incrível que parece só a verdade nos faz capazes de sermos sensíveis para enxergar a necessidade do bem e da beleza.

A pergunta que O Senhor Deus sempre fará a cada uma das criaturas, não é uma pergunta sentimental, na espera de um consenso entre Ele e nós. O que fizeste? O que fizeste com o teu irmão… porque decidiste matar ao teu irmão? Porque levantaste a mão contra ele…

É verdade que uma ação pode ser indiretamente voluntaria quando resulta de uma negligência; mas quando sabemos e temos clareza de que o fim não justifica os meios, não podemos aceitar como voluntario o fato de acabar com a vida de um ser humano; só porque está sendo gestado no ventre de uma mãe menina. Lembremos mais uma vez: “O fim não justifica os meios”.

Um efeito pode ser tolerado sem ser querido pelo agente. Para que o efeito ruim seja imputável; é preciso que seja previsível e que o agente tenha a possibilidade de evita-lo. Uma criança de 10 anos; pode ser manipulada tranquilamente pelos agentes responsáveis e estes decidirem eliminar agora a vida que está no seu ventre. Alguém pode afirmar criança de 10 anos não tem condições para decidir evitar a gravidez; porem ninguém se deteve a pensar que nas condições em que nos encontramos hoje; ciências auxiliares poderiam contribuir para tutelar e garantir a vida tanto da criança mãe como a vida em gestação.

Uma sociedade sentimentalista opta por praticar o aborto e posteriormente encher de presentes e brinquedos o quarto da menina estuprada e sobre a qual foi praticado um aborto. Quanto sentimentalismo toxico! Foi proclamado este gesto como se fosse algo humanitário. Quanta duplicidade ética.

Uma sociedade que é incapaz de oferecer suporte psicológico, obstétrico e jurídico durante a gravidez a uma mulher que foi estuprada quer na sua infância, adolescência, juventude ou na sua vida adulta é sinônimo de uma sociedade atrasada e recluída em métodos que não tem eficácia dando claros e evidentes sinais da sua falta de desenvolvimento.  

Para quem decidiu consensualmente a pratica do aborto sobre esta mãe menina; não houve nenhuma outra saída; aliás não se pensou numa outra opção. Todas as outras seriam opções descabidas; razão pela qual a única opção valida e verdadeira foi aquela de praticar o aborto. Quanta arrogância…

O consenso transgrede todas as normas morais; pois se jacta da sua arrogante atitude na qual só uma via de solução existe. Assim foi exposto neste antigo poema:

“Podes observar como a divindade fulmina com os seus raios os seres que sobressaem demais, sem permitir que se jactem da sua condição; por outro lado, os pequenos não despertam as suas iras. Podes observar também como sempre lança os seus dardos desde o céu contra os maiores edifícios e as árvores mais altas, pois a divindade tende a abater tudo o que descola em demasia”.

A sociedade não se pode permitir se quer pensar em aceitar a gravidez de quem estuprada em tão curta idade; pudesse gerar um novo ser tão diferente daquele que o gerou. Uma sociedade que clama pela tolerância como pacto, mas não como prática é mais uma vez sinônimo de um grupo que aos poucos vem se tornando infra humano.

Uma das Encíclicas de maior atualidade em nossos dias é a Evangelium Vitae. Apresentada por São João Paulo II em 25 de março de 1.995. O texto é um documento distribuído em quatro capítulos. Sua especificidade, sua densidade e de modo especial a forma como o Papa desenvolve o tema da vida humana é simplesmente contundente e esclarecedor. O caráter inviolável da vida humana e de modo particular os sinais que evidenciam uma cultura da morte cada vez mais forte no nosso mundo. Neste último quesito o capítulo III, aborda entre os números 58 a 63 o tema do “Delito abominável do aborto provocado”.

Não existe razão, ainda sendo grave, dramática e dolorosa, que possa justificar a eliminação deliberada de um ser inocente. Precisamente por isso a igreja declara: “O aborto direto, querido como fim e como meio é sempre uma desordem moral grave”. Não existe filosofia ou corrente democrática jurídica que possa amparar a realização do aborto afirmando que vida de uma é mais importante do que a outra.

É possível afirmar que o caminho do conhecimento moral, esteja aberto a erros, a ignorância, a dúvidas; não só no âmbito pessoal como também coletivo; só que não podemos omitir a via do conhecimento, da formação e sobre tudo da própria razão que vai-se aperfeiçoando na medida em que a pessoa avança. Sabemos que existe um ofuscamento moral em relação a própria vida; um suposto conhecimento sobre a Lei natural, quando na verdade hoje mais do que antes o princípio da Lei natural está sendo sufocado e eliminado. Somos chamados a uma pratica da moral a Luz das Bem Aventuranças. Quem descobre o sentido da moral a luz do seguimento de Cristo sabe muito bem que o bem absoluto sempre ilumina a consciência e que esta como sacrário íntimo permite que a pessoa se encontre com Deus, ouvindo a sua Voz e optado pelo bem.

Uma sociedade que promove o pansexualismo, a pornografia on line, o uso desmedido de contraceptivos negando a formação humana para a sexualidade como dom e o amor realização; necessariamente continuará assistindo a constante destruição, violação e aniquilamento dos pequenos, dos vulneráveis e da própria dignidade humana.

Uma educação sexual como serviço a vida; abriria maior espaço para a cultura a vida, evitando a proliferação da cultura a morte. A banalização da sexualidade é um dos principais fatores que cada vez mais ceifa e destrói a vida humana. A sexualidade é uma riqueza da pessoa humana na sua integralidade; energia vital, capacidade de entrar em relação; realidade originaria e originante da vida. O resgate da corporeidade como dom e como totalidade unificada pode ser uma via nova de evangelização diante de situações dolorosas como aquela que estamos vivendo. Precisamos com urgência resgatar na vida moral de cada homem e mulher de boa vontade o elemento relacional, que nos torna cada vez mais capazes de humanidade e neste sentido tenho plena certeza que uma releitura da constituição Conciliar Gaudium et Spes nos permitirá abrir novos horizontes para um diálogo e abrangência da almejada civilização do amor.

 

Pe. Rafael Solano
Pároco da Catedral Metropolitana de Londrina e Vigário Geral

Sobre o aborto induzido da criança de 10 anos ocorrido no Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros, ligado à Universidade de Pernambuco, no Recife, o arcebispo de Belo Horizonte (MG) e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira disse ser lamentável presenciar aqueles que representam a Lei e o Estado com a missão de defender a vida, decidirem pela morte de uma criança de apenas cinco meses, cuja mãe é uma menina de dez anos.

Segundo ele, o caso encerra dois crimes hediondos. “A violência sexual é terrível, mas a violência do aborto não se explica, diante de todos os recursos existentes e colocados à disposição para garantir a vida das duas crianças. As omissões, o silêncio e as vozes que se levantam a favor de tamanha violência exigem uma profunda reflexão sobre a concepção de ser humano”, afirmou.

Em oração, dom Walmor pediu consolação a Deus para todos os envolvidos nessa desafiadora e complexa situação existencial, que feriu de morte a infância, consternando todo o país. Para o presidente da CNBB, o precioso dom da vida precisa ser, incondicionalmente, respeitado e defendido. “Ante a complexidade do ocorrido, devemos ser humildes, reconhecendo as limitações humanas, e sempre compassivos- sejamos sinais do amor de Deus”, afirmou.

O bispo de Rio Grande (RS) e presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Vida e a Família da CNBB, dom Ricardo Hoepers, escreveu artigo questionando a decisão de interrupção da gravidez de uma menina de dez anos que sofreu abuso sexual, em São Mateus (ES).

“É uma história que precisa ser esclarecida. É um processo que precisa ser desvendado. Duas crianças que poderiam viver… teve laudo técnico a favor da vida, teve suporte profissional a favor da vida, teve hospital disposto a cuidar até o fim da gestação, tiveram todas as condições de salvar as duas vidas, mas, de repente, uma transferência, de um Estado para o outro, e toda uma mobilização para que o aborto fosse realizado. Nas mãos de quem ficou a tutela dessa menina, quem decidiu tudo por ela?”, questiona o bispo.

Outros bispos também se manifestaram a respeito do caso. Durante esta semana, o Portal da CNBB vai divulgar uma série de notícias e artigos abordando a temática da defesa da vida, da proteção dos menores, da luta contra os abusos sexuais e do trabalho pastoral da Igreja neste contexto tão desafiador.

 

 

Confira o texto de dom Ricardo na íntegra:

Por que não viver?

Desde o momento que soube do assassinato da bebê de mais de 5 meses, de São Mateus (ES), com uma injeção de potássio na cavidade cardíaca da criança, em Recife (PE), cuja mãe é uma menina de dez anos, fiquei pensando, como explicar esse crime hediondo.

Por que não foi permitido esse bebê viver? Que erro ele cometeu? Qual foi seu crime? Por que uma condenação tão rápida, sem um processo justo e fora da legalidade? Por que o desprezo a tantas outras possibilidades de possíveis soluções em prol da vida? Foram muitos os envolvidos, mas o silêncio e omissão dos órgãos institucionais que têm a prerrogativa de defender a vida, se entregaram às manobras de quem defende a morte de inocentes. Por quê?

É uma história que precisa ser esclarecida. É um processo que precisa ser desvendado. Duas crianças que poderiam viver… teve laudo técnico a favor da vida, teve suporte profissional a favor da vida, teve hospital disposto a cuidar até o fim da gestação, tiveram todas as condições de salvar as duas vidas, mas, de repente, uma transferência, de um Estado para o outro, e toda uma mobilização para que o aborto fosse realizado. Nas mãos de quem ficou a tutela dessa menina, quem decidiu tudo por ela?

Por que a obsessão de apresentar uma única saída? Por que burlar as leis para alcançar esse objetivo de usar de uma criança para um intento assassino?

Difícil raciocinar o que aconteceu, como aconteceu e porque terminou assim!

Ministério Público do Espírito Santo, Conselho Tutelar, Secretários Municipais da Saúde de Vitória e Recife e Secretários Estaduais da Saúde do Espírito Santo e de Pernambuco têm muitas explicações a dar à sociedade brasileira. Por que foi rejeitado um laudo técnico de profissionais e o suporte dos mesmos, obrigando o hospital a dar alta e subitamente transferir a menina-mãe para um hospital em outro Estado? Há claramente um abuso de poder que merece ser investigado.

Mas, de tudo isto, ainda resta a pergunta: por que o bebê não pôde viver? Por que foi sentenciado à morte, mesmo sendo inocente, e tendo todas as condições para vir à vida com os devidos cuidados e com o apoio técnico profissional à disposição? Por que optaram pela morte e não pela vida, desrespeitando a lei, pois se tratava de um bebê de 22 semanas?

Se não somos capazes nem de defender a nossa própria espécie, que tipo de humano estamos nos tornando? Estamos negando nossa própria humanidade. A violência do estupro e do abuso sexual é infame e horrenda, mas a violência do aborto provocado em um ser inocente e sem defesa é tão terrível quanto. Ambos são crimes. Apontam como sinais da degradação moral e da decadência dos costumes, ferindo os valores mais sublimes como o respeito à dignidade do ser humano e a sacralidade do valor da vida!

Mesmo sendo rechaçados pelo nosso discurso religioso em prol da vida, quero dizer que não se trata de nenhum fundamentalismo, mas do uso da reta razão. Quando vem à mente um tema tão básico, tão racional, tão científico, tão antigo, de uma regra de ouro que é uma verdade basilar e aceita por qualquer sociedade civilizada: “Não matarás um inocente”, então nos perguntamos: Por que estão matando nossas crianças? Ou perdemos o fio da história ou nos tornamos reféns de uma razão autodestrutiva, que se odeia e, por isso, mata o seu futuro antes dele nascer…

Hoje faço uma prece por todas as crianças que gostariam nascer, brincar, chorar e viver, mas, foram assassinadas antes de nascer! Esperamos explicações e respostas sobre esse caso. Chega de violência! Não ao aborto! Escolhe, pois, a vida (Dt, 30,19).

Rio Grande (RS), 17 de agosto de 2020.
Dom Ricardo Hoepers
Presidente da Comissão Vida e Família da CNBB

No dia 08 celebramos o dia do Nascituro, que vem do Latim Nascituru – aquele que há de nascer. A data celebra então  o direito à proteção da vida e saúde, à alimentação, ao respeito e a um nascimento sadio. O objetivo é suscitar nas consciências, nas famílias e na sociedade o reconhecimento do sentido e valor da vida humana em todos os seus momentos. Desde 2005 a Igreja realiza entre os dias 1º a 7 de outubro a Semana Nacional da Vida, instituída pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), culminando com o Dia do Nascituro (08/10). É uma data fixa no calendário da CNBB.

A Comissão Vida e Família da CNBB destaca que:  “A atividade da Semana Nacional da Vida e do Dia do Nascituro é uma feliz iniciativa da Igreja. Busca ecoar na consciência, não só dos católicos, mas também de todos os homens e mulheres de nossa sociedade, o quão é necessário criar uma cultura da vida numa realidade que, muitas vezes, passou a considerar certas condições humanas como descartáveis”.

Temos a alegria de informar que, em Londrina, o Dia do Nascituro também foi instituído pela Lei Municipal n. 12.509/2017, fazendo parte do calendário de comemorações oficiais do Município. Deste modo, a rede de escolas pública e particulares de Londrina, associação de pais e demais entidades da sociedade civil poderão promover palestras, seminários e outros eventos alusivos ao Dia do Nascituro, sempre de modo a promover e defender a vida do ser humano que se inicia na concepção e vai até o seu fim natural.

Como disse Madre Teresa de Calcutá: A vida é a VIDA, defende-a.”

ORAÇÃO

Nós vos louvamos, Senhor, Deus da Vida. Bendito sejais, porque nos criastes por amor. Vossas mãos nos modelaram desde o ventre materno. Nós vos agradecemos pelos nossos pais, famílias e todas as pessoas que cuidam da vida humana desde o seu início até o fim. Em Vós somos, vivemos e existimos. Abençoai todos e todas que zelam pela vida humana e a promovem. Abençoai as gestantes e todos os profissionais da saúde. Dai às pessoas e às famílias o pão de cada dia, a luz da fé e o amor fraterno. Nossa Senhora Aparecida, intercedei por nossos nascituros, nossas crianças, nossos jovens, nossos adultos e nossos idosos, para que tenham vida plena em Jesus, que ofereceu sua vida em favor de todos. Amém. (Dom Orlando Brandes, Arcebispo de Aparecida)

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