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A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), que propõe a descriminalização do aborto até a 12ª semana de gestação, começa a ser discutida nesta sexta-feira, 3 de agosto e será concluída na segunda-feira, dia 6. A audiência pública foi convocada pela ministra Rosa Weber, do Supremo Tribunal Federal (STF).

O Arcebispo do Rio de Janeiro e presidente do Regional Leste 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cardeal Orani João Tempesta, escreveu um artigo detalhado no qual alerta os cristãos sobre os riscos sociais e morais da legalização do aborto no Brasil.

Leia o texto na íntegra:

 

Na iminência do aborto, um importante alerta

São muitas as manifestações de irmãos arcebispos e bispos, regionais da CNBB e Setor Família de nossa Conferência Episcopal que se têm pronunciado sobre o momento desastroso que vivemos em nosso país com relação à cultura de morte que querem ver instalada em nossa nação. A todos os irmãos e irmãs em Cristo, defensores da vida humana em geral e demais pessoas de boa vontade a quem este artigo chegar, a graça e a paz de Deus.

Escrevo, por dever de consciência, ante o perigo do avanço do aborto em nosso país. País no qual a Saúde Pública passa por grandes dificuldades, mas poderia ver-se obrigada a praticar o homicídio no ventre materno, por meio do aborto, até o terceiro mês de gestação, se o STF reinterpretar os artigos 124 e 126 do Código Penal.

A Moral Católica: sabemos, por meio da Moral Católica e dos avanços das ciências experimentais, que há vida desde a fecundação do óvulo pelo espermatozoide, de modo que qualquer método artificial para causar o aborto é homicídio, e, portanto, pecado gravíssimo que brada aos céus por vingança (cf. Gn 4,10; Catecismo da Igreja Católica, 2270).

O 5º Mandamento da Lei de Deus preceitua o “Não matarás!” (Êx 20,13) e o primeiro Catecismo da Igreja, dos fins do século I, nos assevera: “Não matarás um nascituro nem assassinarás um infante recém-nascido” (Didaché, II, 2).

Sobre a atual ocasião brasileira, parece caber bem a exortação da Congregação para a Doutrina da Fé, de 1987, que diz:

“No momento em que uma lei positiva priva uma categoria de seres humanos da proteção que a legislação civil deveria conceder-lhes, o Estado nega a igualdade de todos perante a lei. Quando o Estado não põe a sua força ao serviço dos direitos de cada um dos cidadãos, e, particularmente, de quem é mais fraco, são ameaçados os fundamentos mesmos de um Estado de direito (Donum Vitae, 3).

A lógica cristalina de duas mulheres versadas em leis: A Dra. Maria José Miranda Pereira, promotora de Justiça do Distrito Federal e Território, é quem, enquanto mulher e versada em leis, denuncia, com palavras fortes e muita lógica, a incoerência dos defensores da ideologia abortista. Escreve ela: “Segundo eles, a proibição do aborto feriria a ‘dignidade da pessoa humana’ (da pessoa que já nasceu) e o direito ‘das mulheres’ à vida, à liberdade, à saúde, à integridade física, psicológica e até a igualdade de direitos com o homem, chamada de igualdade de gênero. Esquartejar a criança por nascer com lâminas afiadas (aborto por curetagem) ou aspirá-la em pedacinhos (aborto por aspiração) não violaria a proibição constitucional da tortura. Mas impedir que a mulher aborte durante o primeiro trimestre seria causar nela um mal-estar qualificável como tortura (!), o que é vedado pela Constituição”.

“Revoltante em tudo isso não é apenas a hediondez do aborto, o mais covarde dos assassinatos, mas também o infame meio empregado para a sua descriminalização. Sem conseguir êxito no Parlamento, onde os representantes do povo brasileiro repetidas vezes rechaçaram e sepultaram os projetos de lei abortistas, o caminho agora – chamado certa vez por Ellen Gracie de ‘atalho fácil’ – é o Supremo Tribunal Federal. Seus 11 ministros são chamados a interpretar, reinterpretar e “desinterpretar” a Carta Magna, de modo a encontrar algum pretexto que favoreça a tese abortista” (“Aborto? Não em meu nome”. Correio Braziliense, 19 maio 2018, p. 11).

A Dra. Cláudia Löw, jurista, atuante em Porto Alegre (RS), é outra corajosa mulher que escreve: “Em 1940, quando editado o Código Penal Brasileiro, não havia o conhecimento de embriologia que existe hoje. Por isso, para acompanhar o progresso, os casos de legalização do aborto deveriam ser restringidos, e não ampliados”.

Mais:

“Outra questão importante a ser considerada é o fato de que a maioria das mulheres aborta porque está sendo forçada a isso pelos homens. Legalizar o aborto é legitimar uma das piores formas de opressão da mulher.

Não é por acaso que as primeiras feministas eram contra o aborto! Ainda, está comprovado que o aborto provocado, mesmo feito em clínicas especializadas, faz crescer a taxa de infertilidade e outras complicações na mulher, como por exemplo, a ‘síndrome pós-aborto’ que onera o sistema de saúde com a necessidade de tratamentos psicológicos” (“Pergunte e Responderemos”, n. 522, dezembro de 2005, p. 562-564).

Fala a Ciência: Ao se posicionar, de modo claro e coerente, contra o aborto, escreve o Dr. Vinícius Loures Rossinol, mestre pelo Departamento de Endocrinologia da Unifesp e pediatra especialista em adolescente: “Em 1827, o pai da embriologia, Karl Ernest Von Baer, foi quem, pela primeira vez, visualizou uma fecundação”.

“A ele é atribuída a afirmação de que ‘a vida humana começa na concepção, isto é, no momento em que o espermatozoide entra em contato com o óvulo, fato que ocorre, já nas primeiras horas, após a relação sexual. É nessa fase, a do zigoto, que toda a identidade genética do novo ser é definida. A partir daí, é um processo contínuo, autodeterminado, coordenado, gradativo…’. Autodeterminado significa que, já dentro do corpo da mãe, quem comanda todo o processo de crescimento é a própria filha ou filho. A mãe é o meio-ambiente necessário, mas todo o processo bioquímico e biológico se dá no filho e através do filho” (“Início da vida e aborto”, Aleteia, 25/06/2018, online).

No século XX, Jérôme Lejeune, geneticista francês pesquisador da Síndrome de Down, trouxe, após novas investigações, conclusões muito importantes sobre a origem do ser humano. Com efeito, afirma ele: “Não quero repetir o óbvio. Mas, na verdade, a vida começa na fecundação.

Quando os 23 cromossomos masculinos transportados pelo espermatozoide se encontram com os 23 cromossomos da mulher (no óvulo), todos os dados genéticos que definem o novo ser humano já estão presentes. A fecundação é o marco do início da vida. Daí para a frente qualquer método artificial para destruí-la é um assassinato”. (Pergunte e Responderemos n. 485, novembro de 2002, p. 462-468).

Mais: “A vida tem uma longa história, mas cada um de nós tem um início muito preciso, que é o momento da concepção. A vida começa no momento em que toda a informação necessária e suficiente se encontra reunida para definir o novo ser. Portanto, ela começa, exatamente, no momento em que toda a informação trazida pelo espermatozoide é reunida à informação trazida pelo óvulo. Desde a penetração do espermatozoide se encontra realizado o novo ser. Não um homem teórico, mas já aquele que mais tarde chamarão de Pedro, de Paulo ou de Madalena.”

“Se o ser humano não começa por ocasião da fecundação, jamais começará. Pois de onde lhe viria uma nova informação? O bebê de proveta o demonstra aos ignorantes. Aceitar o fato de que, após a fecundação, um novo ser humano chegou à existência já não é questão de gosto ou de opinião” (J. Lejeune in E. Bettencourt. “Problemas de Fé e Moral”. Rio de Janeiro: Mater Ecclesiae, 2007, p. 176).

À luz desses dados da ciência, pode o Dr. Ivanaldo Santos, doutor em filosofia e autor de inúmeros artigos em revistas especializadas de todo o mundo, sustentar que “graças ao projeto genoma e a decifração do DNA humano é possível afirmar que,

a partir da primeira célula do novo ser, ou seja, do embrião, formado no ventre da mãe, temos um ser humano completo”.

“O motivo disso é que durante os nove meses de gestação e mais durante toda a vida pós-nascimento até a morte, nenhum material genético é acrescentado ao indivíduo. Além disso, um feto contém todas as características humanas (respira, sente dor, tem braços, pernas…). Não há, até o presente momento, uma explicação filosófica aceitável para dizer que o embrião humano não é pessoa humana” (“A vida e a dignidade humana”, Zenit, 26-27/06/2012, online).

A partir desses dados da ciência experimental e da reflexão filosófica, pode-se afirmar, de modo claro, que a vida começa na concepção e o aborto é, portanto, um cruel e covarde homicídio no ventre materno que, longe de ser defendido, há de ser rechaçado.

A palavra do Direito: Essa ação do STF, agindo em contrário à Constituição Federal que a todos garante o direito à vida como cláusula pétrea (art. 5º caput), leva-nos a cair em uma tremenda insegurança jurídica, pois a Corte Suprema se dá o direito não só de legislar – papel exclusivo do Poder Legislativo –, mas até de reformar ou “desintrerpretar” – nas palavras da Dra. Maria José Miranda Pereira – a Constituição.

Para onde iremos?–Isso é o que, há alguns anos, já preocupava o renomado jurista Dr. Ives Gandra da Silva Martins ao escrever o seguinte: “Pela Lei Maior brasileira, a Suprema Corte é a ‘guardiã da Constituição’ – e não uma ‘Constituinte derivada’”. No entanto, no Brasil, diz o Dr. Ives:

“A questão que me preocupa é este ativismo judicial, que leva a permitir que um tribunal eleito por uma pessoa só substitua o Congresso Nacional, eleito por 130 milhões de brasileiros, sob a alegação de que além de Poder Judiciário, é também Poder Legislativo, sempre que imaginar que o Legislativo deixou de cumprir as suas funções. Uma democracia em que a tripartição de poderes não se faça nítida, deixando de caber ao Legislativo legislar, ao Executivo executar e ao Judiciário julgar, corre o risco de se tornar ditadura, se o Judiciário, dilacerando a Constituição, se atribua poder de invadir as funções de outro. E, no caso do Brasil, nitidamente o constituinte não deu ao Judiciário tal função”.

Que poderia o Congresso Nacional fazer no caso? – Poderia tomar a decisão, baseada no artigo 49, inciso XI, da CF, que lhe permite sustar qualquer invasão de seus poderes por outro poder (artigo 142 “caput”), para garantir-se nas funções usurpadas.

(http://anajus.jusbrasil.com.br/noticias/2687189, acessado em 30/11/16). É de se esperar que o Congresso Nacional não desaponte a milhões de brasileiros defensores da vida.

Retrocesso moral-cultural: a Igreja foi a grande promotora de uma positiva virada moral-cultural na história, como escreve G. Albanese: “O pai cristão que incita a ama a lançar o filho recém-nascido ao lixo da rua… O mártir cristão Leônidas, que descobre o peito de seu filhinho Orígenes adormecido e o beija com veneração como sendo templo do Espírito Santo: eis concretizados dois mundos, duas filosofias” (“Alla ricerca della fede”. Assis, 1969, p. 276, apud E. Bettencourt. “Problemas de Fé e Moral”, p. 89).

A despenalização do aborto ou a sua aprovação não constituem avanço algum, mas, ao contrário, grave retrocesso moral e cultural. Sobre isso, Jérôme Lejeune, geneticista francês, diz que “em nossos dias, o embrião é tratado como o escravo antes do cristianismo; podiam vendê-lo, podiam matá-lo… O pequeno ser humano, aquele que traz toda a esperança da vida, torna-se comparável ao escravo de outrora. Uma sociedade que mata seus filhos, perdeu, ao mesmo tempo, sua alma e sua esperança” (E. Bettencourt. “Problemas de Fé e Moral”, p. 176).

Conclusão: 

Diante do exposto, cada fiel católico e demais pessoas de boa vontade são chamados a, dentro da lei e da ordem, tomar posição em favor da vida e contra a matança de inocentes e indefesos no ventre materno.

Há de existir incessante cobrança para que o Congresso Nacional feche, com chave de ouro, as portas ao aborto, bem como a exigência de projetos de ação dos partidos e dos candidatos em favor da vida nas eleições deste ano. Estejamos atentos em quem votar neste ano e nos programas dos partidos que vêm bater às nossas portas. Lutar pela vida em todas as frentes lícitas e negar nosso voto a partidos e/ou candidatos que defendem o homicídio no ventre materno é também um grave dever de consciência. Ninguém pode, sob qualquer pretexto, colaborar com o mal (cf. “Catecismo da Igreja Católica” n. 1868).

Nossa Senhora da Conceição Aparecida, advogai junto a Deus pelo nosso sofrido e amado Brasil! Amém.

CNBB

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