Por Dom Orlando Brandes
Arcebispo Metropolitano de Londrina
“Eu desci” (Ex 3, 7). Deus desce para libertar o povo hebreu, escravo no Egito. Desce em
Belém, na estrebaria, no imundo. Deus é descido da cruz e colocado nos braços de sua
mãe. Desce até a mansão dos mortos, desce ao túmulo quando Jesus é sepultado. Eis o
Deus da descida, da saída de si, do abaixamento. Deus desce, vem antes, vem primeiro, se
antecipa, tem a iniciativa da procura. Desce porque ama. Quem ama cuida e quer estar
perto.
Deus desce em Pentecostes, na descida do Espírito Santo. Desce em cada consagração
eucarística. Desce e faz morada no coração humano. Desce e habita no pobre, no preso, no
doente, no peregrino. Deus vem ao encontro, quer dialogar, e estar junto de nós, em nós,
Deus conosco. Isso é tudo.
Deus desce até nossa situação, está nos acontecimentos, nas feridas, nas provações, na
experiência de nossos pecados. Deus desce onde dois ou três estão reunidos em seu
nome, como desce para erguer todos os caídos. Ele é o “Eu Sou. Eu Estou”: “Eu sou Aquele
que está convosco”. Ele inclina seus ouvidos, para nos ouvir, enfaixa nossas feridas, tira o
pobre do lixo e o faz sentar-se entre os nobres. Ele desce até o útero onde somos gerados e
nos modela, faz a estéril ser mãe de muitos filhos. Deus desce até a matéria, se faz óvulo,
bebê, carne, menino. Se faz pão, se faz escravo e pequeno. Eis o mistério da encarnação e
a espiritualidade do Natal.
Para encontrar Deus, precisamos aprender a descer. Há uma descida pela qual todos
passamos, isto é, o envelhecimento e a morte. É preciso aprender a descer. Descer do
nosso status, do nosso trono, do nosso cargo, da nossa superioridade e também descer do
cavalo. Descer até o chão e até ao irmão, ao inimigo. Quanto mais descemos, mais nos
elevamos.
Descer até o nosso interior, ao nosso eu profundo, às nossas sombras, ao nosso lado
podre, é a maior viagem da vida. Esta viagem de descida nos enobrece, eleva, liberta,
enaltece, amadurece. Descer ao nosso barro como acontece ao grão de trigo. Grão que se
tornará trigal. Às vezes para descer precisamos ser empurrados pela graça de Deus, para
que possamos cair em nós mesmos e nos levantar recuperados. Desça sobre nós o Espírito
Santo para iluminar nossas descidas que nos fazem renascer.
Como o filho pródigo desceu até ao fundo do poço e caiu em si, precisamos muitas vezes
de experiências fortes, ir ao fundo do poço, para renascer. Descer até à nossa consciência
para ouvir a voz de Deus que grita: fazer o bem e evitar o mal. Natal é Deus que desce para
nos elevar. Natal é um chamado à humanidade, à descida dos montes elevados do
orgulho, para as profundezas de nossas sombras, feridas, fraquezas. É assim que
renascemos e nos tornamos novas criaturas. Quem desce se eleva.
Dom Orlando Brandes