[dropcap]A[/dropcap] reflexão sobre o Espírito Santo (pneumatologia, do grego pneuma) se desenvolveu fortemente na Igreja latina, especialmente desde o Concílio Vaticano II (1962-1965) e do pedido de Paulo VI para que a cristologia e a eclesiologia do Vaticano II fossem complementadas com um estudo e um culto mais aprofundado sobre o Espírito Santo (Paulo VI, em audiência geral de 6 jun 1973; cf. João Paulo II, Dominum et vivificantem, n.2).
No entanto, a pneumatologia desenvolvida no Primeiro Mundo durante o período pós-conciliar incide mais sobre as dimensões pessoais e eclesiais do Espírito do que sobre aspectos históricos, sociais e políticos, talvez inspirando-se mais em Lumen Gentium 4 (o Espírito na Igreja) do que em Gaudium et Spes 11 e 44 (os sinais dos tempos).
O número 4 da Lumen Gentium afirma, precisamente: “Consumada a obra que o Pai confiou ao Filho ( Jo. 17,4), foi enviado o Espírito Santo para que santificasse continuamente a Igreja e deste modo os fiéis tivessem acesso ao Pai, por Cristo, num só Espírito. (…)O Espírito habita na Igreja e nos corações dos fiéis, como num templo (cfr. 1 Cor. 3,16;). (…) A Igreja, que Ele conduz à verdade total (cfr. Jo. 16,13) e unifica na comunhão e no ministério, enriquece-a Ele e guia-a com diversos dons hierárquicos e carismáticos e adorna-a com os seus frutos (cfr. Ef. 4, 11-12). Pela força do Evangelho rejuvenesce a Igreja e renova-a continuamente e leva-a à união perfeita com o seu Esposo”. Mostra claramente como o Espírito Santo conduz a vida da Igreja nos tempos atuais e no futuro até o encontro definitivo com Deus.
Mas não foi só esta dimensão da pneumatologia que se desenvolveu no pós- concílio. A Gaudium et Spes, em ao menos dois números, apresenta um outro modo de entender, completando o que o Concílio Vaticano II quer dizer. O número 11 destaca “o discernimento dos sinais dos tempos” como fruto da ação do Espírito Santo: “O Povo de Deus, movido pela fé com que acredita ser conduzido pelo Espírito do Senhor, o qual enche o universo, esforça-se por discernir nos acontecimentos, nas exigências e aspirações, em que participa juntamente com os homens de hoje, quais são os verdadeiros sinais da presença ou da vontade de Deus. Porque a fé ilumina todas as coisas com uma luz nova, e faz conhecer o desígnio divino acerca da vocação integral do homem e, dessa forma, orienta o espírito para soluções plenamente humanas”.
Completa mostrando o modo como a Igreja deve se relacionar com os valores autenticamente humanos: “…propõe-se, antes de mais, julgar a esta luz os valores que hoje são mais apreciados e pô-los em relação com a sua fonte divina. Tais valores, com efeito, na medida em que são fruto do engenho que Deus concedeu aos homens, são excelentes, mas, por causa da corrupção do coração humano, não raro são desviados da sua reta ordenação e precisam de ser purificados”.
Outro dado interessante é o reconhecimento do progresso da humanidade nas mais diversas áreas do conhecimento. O número 44 da Gaudium et Spes reconhece, nestes termos: “Assim como é do interesse do mundo que ele reconheça a Igreja como realidade social da história e seu fermento, assim também a Igreja não ignora quanto recebeu da história e evolução do gênero humano”. Todo o conhecimento produzido nas mais diversas culturas pode ser aproveitado em vista da ação evangelizadora da Igreja: “A experiência dos séculos passados, os progressos científicos, os tesouros encerrados nas várias formas de cultura humana, os quais manifestam mais plenamente a natureza do homem e abrem novos caminhos para a verdade, aproveitam igualmente à Igreja. Ela aprendeu, desde os começos da sua história, a formular a mensagem de Cristo por meio dos conceitos e línguas dos diversos povos, e procurou ilustrá-la com o saber filosófico. Tudo isto com o fim de adaptar o Evangelho à capacidade de compreensão de todos e às exigências dos sábios. Esta maneira adaptada de pregar a palavra revelada deve permanecer a lei de toda a evangelização”. Assim a certeza da presença do Espírito Santo na Igreja continuará abrindo caminhos de evangelização para todas as culturas “até que Ele venha!”.
Dom Geremias Steinmetz
Arcebispo de Londrina