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[dropcap]N[/dropcap]a caminhada do Ano Litúrgico a Igreja Católica celebra a Festa de Pentecostes e com ela encerra o Tempo Pascal. Celebra-se assim o início da atividade da Igreja, o trabalho da evangelização. Recorda-se, especialmente, o mandato do próprio Jesus aos seus discípulos: Ide a todos os povos, anunciai e batizai (Mc 16,15). Encerrado o Tempo Pascal a Igreja nos oferece a celebração de algumas das grandes verdades da fé: A solenidade da Santíssima Trindade e a solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue do Senhor (Corpus Christi).

A devoção à Trindade, entendida como “conceito” elaborado pelas escolas teológicas, não é muito antiga: remonta ao século X. A tradição litúrgica patrística, porém, não ignorou a Trindade vendo-a sempre na realização da própria história da salvação como uma realidade dinâmica. Com razão A. Adam observa: “O fato de que esta festa seja celebrada justamente no domingo depois do de Pentecostes pode ser interpretado como um agradecido olhar retrospectivo sobre o cumprimento da salvação; mistério que, segunda a antiga teologia dos Santos Padres, é realizado pelo Pai, através do Filho, no Espírito Santo”.

A Festa de Corpus Christi é produto da devoção eucarística medieval ocidental. Surgiu para afirmar a presença real contra os erros de Berengário de Tours e foi estendida a toda a Igreja pelo Papa Urbano IV em 1264. Motivou ainda o limite do conteúdo desta festa: atenção à presença real considerada de modo muito independente do mistério eucarístico total. A reforma do Concílio Vaticano II, com a denominação mais completa dada à solenidade (menciona-se não somente o corpo mas também o sangue de Cristo) e com maior riqueza de textos bíblicos, quis exprimir uma visão do mistério eucarístico que leve em conta todos os seus aspectos.

Visto que estamos vivendo o Ano B, as leituras apresentam a eucaristia como sacrifício da Aliança. O texto do Êxodo (24,3-8) descreve a aliança do Sinai selada pelo sacrifício e pela aspersão do povo com o sangue das vítimas imoladas: “Este é o sangue da aliança que o Senhor faz com vocês através de todas essas cláusulas”. O Evangelho de Marcos (14,12.16.22-26) apresenta a instituição da eucaristia como cumprimento da  antiga Páscoa e atuação da nova e eterna aliança: Jesus diz: “Isto é o meu sangue, o sangue da aliança, que é derramado em favor de muitos”. O trecho da Carta aos Hebreus (9,11-15) coloca em confronto o sacrifício de Cristo, sacerdote – vítima, com aquele oferecido no grande dia da expiação. A oferta sacrifical – pascal de Cristo não é somente um sacrifício de expiação, mas a oferta do sangue é também um sacrifício – aliança.

A propósito, o Papa Bento XVI publicou em 2007 a Exortação Apostólica Pós-Sinodal Sacramentum Caritatis, sobre a eucaristia, fonte e ápice da vida e da missão da Igreja. Nela busca esclarecer a relação intrínseca entre celebração e adoração. “Neste significativo aspecto da fé da Igreja, encontra-se um dos elementos decisivos do caminho eclesial que se realizou após a renovação litúrgica querida pelo Concílio Vaticano II. Quando a reforma dava os primeiros passos, aconteceu às vezes não se perceber com suficiente clareza a relação intrínseca entre a Santa Missa e a adoração do Santíssimo Sacramento” (n.66).  Tentando responder a algumas objeções, acrescenta: “A adoração eucarística é apenas o prolongamento visível da celebração eucarística, a qual, em si mesma, é o maior ato de adoração da Igreja: receber a Eucaristia significa colocar-se em atitude de adoração d’Aquele que comungamos. Precisamente assim, e apenas assim, é que nos tornamos um só com Ele e, de algum modo, saboreamos antecipadamente a beleza da liturgia celeste. O ato de adoração fora da Santa Missa prolonga e intensifica aquilo que se fez na própria celebração litúrgica. Com efeito, somente na adoração pode maturar um acolhimento profundo e verdadeiro. Precisamente neste ato pessoal de encontro com o Senhor amadurece depois também a missão social, que está encerrada na Eucaristia e deseja romper as barreiras não apenas entre o Senhor e nós mesmos, mas também, e sobretudo, as barreiras que nos separam uns dos outros” (n.66).

No número 67, o Papa Bento XVI recomenda: “aos pastores da Igreja e ao povo de Deus a prática da adoração eucarística tanto pessoal como comunitária. Para isso, será de grande proveito uma catequese específica na qual se explique aos fiéis a importância deste ato de culto que permite viver, mais profundamente e com maior fruto, a própria celebração litúrgica”.

Dom Geremias Steinmetz
Arcebispo Metropolitano de Londrina

Foto destaque: Douglas Estevam

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