O ano de 2020 foi totalmente atípico. Ninguém, no final de 2019, previa a realidade que viveríamos poucas semanas mais tarde. Todos estávamos programados para mais um ano de muito trabalho: celebrações, cursos, estudos, visitas pastorais, encontros de pastorais e movimentos, trabalhos missionários, viagens, etc. De repente tudo começou a ser cancelado, remarcado e, por fim, desmarcado. Ao findarmos o ano, ouso afirmar que nos recuperamos em um nível satisfatório mas há muito que precisa ser feito e há muitos desafios que precisam ser superados.

 

Já nos dias da eclosão da pandemia do Coronavírus a Igreja de Londrina se preocupou em dar alguns direcionamentos para que o efeito dela pudesse ser o menos prejudicial possível. Lembro-me bem que definimos seguir a orientação das autoridades sanitárias na questão das celebrações e permanecermos em diálogo com a sociedade. A decisão de trabalhar “on-line” também foi no sentido de não deixar as comunidades perderem o contato entre si. Juntamente com a Cáritas Arquidiocesana, decidimos iniciar uma campanha de arrecadação de alimentos, roupas, calçados, colchões, prevendo a avalanche de pessoas que iriam precisar de ajuda. Insere-se neste contexto a parceria com a Secretaria de Assistência Social de Londrina com a cedência de três endereços da Igreja para acolher pessoas em situação de rua, etc..

 

O XVII Plano Arquidiocesano de Pastoral utiliza como níveis de trabalho a Pessoa, a comunidade e a Sociedade. Sobre o nível da Sociedade diz literalmente: “Este nível considera como desafio da realidade, os esforços de nossas comunidades no anúncio e na construção de uma sociedade solidária para denunciar e enfrentar o escândalo da exclusão e da violência na sociedade consumista, da intolerância e do ódio, afirmando os direitos humanos e anunciando o Reino de Deus”.  A importância de atuar evangelicamente em relação à Sociedade, na busca pela garantia de vida plena das pessoas e de uma cultura da vida, da justiça e da fraternidade, está fundamentada a partir dos seguintes apelos da realidade: 1. A sociedade brasileira é uma das mais desiguais do mundo. 2. Nossas comunidades anseiam construir uma sociedade justa fraterna e solidária, em diversos espaços.  3. Há iniciativas concretas de práticas solidárias em nossas comunidades na busca da superação da opressão e exploração onde reivindicam políticas públicas. Na minha avaliação, com tudo o que foi feito na relação com as pessoas e na área da caridade pela Cáritas, pela Arquidiocese, pelas paróquias, pelas comunidades demos um passo enorme e de qualidade apontando para a possibilidade concreta de que podemos ser mais ousados na busca de soluções para os problemas e para a possibilidade concreta de que eles têm solução.

 

Como expectativa para o futuro, nutro a esperança de uma retomada com mais qualidade e uma renovação no modo de evangelizar sem nunca prescindir da construção de comunidades concretas e dinâmicas. Nos poucos passos de retomada que demos percebi como o nosso povo é fiel à Igreja ou à sua paróquia, especialmente no dízimo e as contribuições pessoais com as obras da Igreja; percebo que temos que investir com muita força na formação básica dos católicos; vi que a PASCOM bem organizada será uma grande resposta pastoral para jovens e adolescentes, por fim, temos que tratar com maior realismo a área da economia nas nossas paróquias e na arquidiocese.

Dom Geremias Steinmetz
Arcebispo de Londrina

Artigo publicado na Revista Comunidade, Edição Dezembro 2020
Foto destaque: Missa em Ação de Graças pelo Ano de 2020 – Catedral de Londrina (31/12/2020) Ernani Roberto

 

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[dropcap]C[/dropcap]ada vida nesta terra, também a do homem, encontra o seu ponto final na morte. A vida humana, desde o início, é orientada para a morte, é “ser para a morte”. Num primeiro momento nós a experimentamos na morte de outros, mas nenhum evento é tão inevitável como a própria morte. Diferentemente de criaturas inferiores, o homem sabe que a morte está diante dele. Ele a espera e a experimenta com consciência. O seu instinto de conservação, porém, se opõe à morte e não consegue aceitar imediatamente este seu destino certo. A morte que destrói a vida é vista como um inimigo contra o qual é preciso se defender e prevenir. Pensa-se, então, nos meios e nas possibilidades para evitá-la. Mas, também isto, logo se revela como inútil porque os remédios, a medicina podem no máximo retardar o declínio das forças do corpo, mas não impedi-la. Diante disso tudo resta o temor.

 

Cemitério São Pedro de Londrina (Foto Ernani Candido Roberto)

Nos nossos tempos ainda podemos acrescentar as numerosas notícias dos Meios de Comunicação Social, de mortes violentas e cruéis provocadas por acidentes, catástrofes, homicídios, atos de terrorismo e guerra. O homem não só tenta se proteger de toda morte violenta, mas também proteger-se da morte natural que acontece em consequência da velhice, da doença. Um motivo dessa “rebelião” do homem contra a morte pode ser a convicção de que a vida humana seja limitada à vida terrena, e por isso a morte seria a extinção definitiva da existência humana. Outra razão poderia ser que “o germe de eternidade que o homem carrega em si, não deixa que o homem simplesmente aprove a morte” (GS 18). A fé em Deus criador não deixa que o homem aceite “tornar-se um nada” diante da morte. Por isso se pergunta por um significado mais profundo da morte. Como resposta a esta pergunta, a morte aparece não como uma destruição total ou como ponto final na vida, mas como “uma passagem para uma etapa mais feliz da vida”. Com esta certeza a morte se torna tolerável, aceitável. Pela fé em uma vida ulterior após a morte, seja da natureza que for, e na esperança de alcançar tal vida, o homem é capacitado a suportar a angústia diante da morte.

 

A razão última para a fé e a esperança do cristão diante da morte é a morte e a ressurreição de Cristo. A sua morte violenta foi uma passagem a uma vida nova, uma exaltação. Jesus foi “coroado de honra e de glória por causa da sua morte” (Fl 2,9). Portanto, a sua morte não foi absurda, mas trouxe a vitória sobre a morte mesmo que ainda não a sua completa eliminação e destruição: “Para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fl 1,21). A Igreja cerca de especial amor e devoção a memória dos fiéis defuntos e oferece-lhes orações em sufrágio dos seus pecados. Na morte de seus filhos, ela celebra o Mistério Pascal do Filho de Deus, centro de nossa fé. O dia 2 de novembro, Dia de Finados, é um convite à esperança, enquanto aguardamos – “até que Ele venha” (1Cor 11,26) – a consumação do mistério redentor em nossas vidas, através de nossa associação ao mistério da vida e da morte de Cristo. Não é, portanto, um dia de tristeza e revolta, mas de esperança e paz no nosso futuro que está em Deus.

Dom Geremias Steimnetz
Arcebispo Metropolitano de Londrina

 

Foto destaque: Dom Geremias Steinmetz e Monsenhor José Bernard Agius, Missa no Cemitério Municipal de Rolândia, Visita Pastoral, Setembro de 2019 (Foto Tiago Queiroz)