Irmã Elza Brogeato, missionária xaveriana no Chade (África) conta sobre o interesse da juventude na conversão ao cristianismo e os desafios de evangelizar em um país de maioria mulçumana

Considerado um dos países mais pobres da África e de maioria mulçumana, a República do Chade, na região Centro-Norte africana, está vivendo um aumento da população cristã, principalmente católica, um fenômeno que vem se replicando pelo continente africano, segundo o Anuário Pontifício 2018 (leia mais na página 10). Mas também tem sido motivo de preocupação pelas religiosas e padres missionários que atuam no país.

“A preocupação é como acompanhar esse pessoal que está se batizando. Quando eram menos pessoas, o acompanhamento era mais adequado, individual”, comentou a irmã Elza Brogeato, Xaveriana Missionária de Maria. A espiritualidade da população ainda é arraigada nas crenças dos antepassados de espíritos malignos e feitiçarias.

Por isso, no Chade, para ser batizada, a pessoa tem que passar por quatro anos de preparação. “Não se batiza crianças. Só a partir dos 12 anos, porque o ambiente lá ainda não é cristão. Como batizar uma criança se o pai ainda é totalmente envolvido na cultura deles? Então vai ser devagar”, disse a irmã.

Irmã Elza é missionária desde 2012 na comunidade de Beren, distante 400km da capital Jamena. Ela já esteve em missão lá em 1991 e 2004. De férias em Londrina, a missionária conversou com o JC sobre a sua missão e os desafios de evangelizar em um lugar tão diferente da realizada brasileira. 

Ela conta que há pouco tempo eram adultos e idosos que queriam ser batizados. Em média 30 batizados por ano. Hoje, são jovens. “Este ano, 500 jovens se inscreveram para fazer o catecumenato”, disse.  Eles fazem catequese nos vilarejos e sessões de formação nas paróquias. A catequese também é diferente do método brasileiro. “É uma catequese diferente, pela tradição oral. Proclama-se o Evangelho ou quando eles sabem ler o Evangelho é lido, a Palavra é refletida e pensada como vivenciar. Lá é tudo rude, tudo direto”, relata a irmã. O batizado ocorre no Sábado de Aleluia.

Outro fenômeno que está ocorrendo no Chade é a ida de protestantes para a Igreja Católica. “Cada missa, o padre apresenta uns dois ou três protestantes que estão vindo para a Igreja

Católica. Também há os católicos que mudaram para os 

protestantes e agora estão voltando”, comentou.

As religiosas ainda não conseguiram identificar o que tem fomentado essa busca pela fé cristã.

 

Uma realidade totalmente diferente

O pequeno país africano vive da agricultura e, recentemente, começou a exploração de petróleo. As condições climáticas, falta de infraestrutura e a cultura ainda freiam o desenvolvimento do país.

Ao longo do ano são oito meses sem chuva, energia elétrica ainda não chegou aos povoados e a população ainda acredita que uma pessoa bem-sucedida é um “comedor de almas”.

A irmã Elza Brogeato, Xaveriana Missionária de Maria, afirma que a realidade cultural no país é tão diferente da brasileira ou européia que há até uma certa dificuldade de entender o conceito de pobreza.  Ela conta que quando as Irmãs de Madre Tereza, que trabalham com os pobres mais pobres, chegaram no país, tinham dificuldade de identificar quem eram esses pobres.

“Tem que olhar pela cultura. Uma mulher que não tem filhos não vale nada. É excluída. Uma pessoa que tenha alguma deficiência física também é excluída e é taxada de feiticeira. Quando sentem essa etiqueta aí é que está a pobreza. É outro estilo, não é a aparência”, explica irmã Elza.

As crenças também dificultam o crescimento financeiro pessoal. “Quando alguém melhora de vida, eles dizem que a pessoa é feiticeiro “comedor de almas”, por isso ele ficou rico. Daí as pessoas têm medo”, conta a irmã.

Essa é uma questão difícil dos missionários abordarem. “A gente respeita, porque é inútil falar. Eles são amarrados com essas ideias, mesmo as pessoas que foram para universidade. Isso só vai mudar quando eles forem se aprofundando no cristianismo”, afirma a missionária.

Outro ponto que também emperra a evolução pessoal, segundo a irmã, é que quem é funcionário e ganha salário também precisa sustentar a família toda – pai, mãe, filhos, esposas, sobrinhos. “Eles são atormentados pela família e isso não estimula o crescimento da pessoa. Cria barreiras”, diz a missionária. 

Apesar de ser um país de maioria mulçumana, irmã Elza afirma que a convivência com eles é tranquila e respeitosa. Eles convidam as missionárias para suas festas religiosas e participam das celebrações especiais das irmãs. 

 

Aline Machado Parodi
Pascom Arquidiocesana

Reportagem publicada na edição de abril de 2019 no Jornal da Comunidade (JC).

Fotos: Arquivo Pessoal