[dropcap]C[/dropcap]ada vida nesta terra, também a do homem, encontra o seu ponto final na morte. A vida humana, desde o início, é orientada para a morte, é “ser para a morte”. Num primeiro momento nós a experimentamos na morte de outros, mas nenhum evento é tão inevitável como a própria morte. Diferentemente de criaturas inferiores, o homem sabe que a morte está diante dele. Ele a espera e a experimenta com consciência. O seu instinto de conservação, porém, se opõe à morte e não consegue aceitar imediatamente este seu destino certo. A morte que destrói a vida é vista como um inimigo contra o qual é preciso se defender e prevenir. Pensa-se, então, nos meios e nas possibilidades para evitá-la. Mas, também isto, logo se revela como inútil porque os remédios, a medicina podem no máximo retardar o declínio das forças do corpo, mas não impedi-la. Diante disso tudo resta o temor.

 

Cemitério São Pedro de Londrina (Foto Ernani Candido Roberto)

Nos nossos tempos ainda podemos acrescentar as numerosas notícias dos Meios de Comunicação Social, de mortes violentas e cruéis provocadas por acidentes, catástrofes, homicídios, atos de terrorismo e guerra. O homem não só tenta se proteger de toda morte violenta, mas também proteger-se da morte natural que acontece em consequência da velhice, da doença. Um motivo dessa “rebelião” do homem contra a morte pode ser a convicção de que a vida humana seja limitada à vida terrena, e por isso a morte seria a extinção definitiva da existência humana. Outra razão poderia ser que “o germe de eternidade que o homem carrega em si, não deixa que o homem simplesmente aprove a morte” (GS 18). A fé em Deus criador não deixa que o homem aceite “tornar-se um nada” diante da morte. Por isso se pergunta por um significado mais profundo da morte. Como resposta a esta pergunta, a morte aparece não como uma destruição total ou como ponto final na vida, mas como “uma passagem para uma etapa mais feliz da vida”. Com esta certeza a morte se torna tolerável, aceitável. Pela fé em uma vida ulterior após a morte, seja da natureza que for, e na esperança de alcançar tal vida, o homem é capacitado a suportar a angústia diante da morte.

 

A razão última para a fé e a esperança do cristão diante da morte é a morte e a ressurreição de Cristo. A sua morte violenta foi uma passagem a uma vida nova, uma exaltação. Jesus foi “coroado de honra e de glória por causa da sua morte” (Fl 2,9). Portanto, a sua morte não foi absurda, mas trouxe a vitória sobre a morte mesmo que ainda não a sua completa eliminação e destruição: “Para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro” (Fl 1,21). A Igreja cerca de especial amor e devoção a memória dos fiéis defuntos e oferece-lhes orações em sufrágio dos seus pecados. Na morte de seus filhos, ela celebra o Mistério Pascal do Filho de Deus, centro de nossa fé. O dia 2 de novembro, Dia de Finados, é um convite à esperança, enquanto aguardamos – “até que Ele venha” (1Cor 11,26) – a consumação do mistério redentor em nossas vidas, através de nossa associação ao mistério da vida e da morte de Cristo. Não é, portanto, um dia de tristeza e revolta, mas de esperança e paz no nosso futuro que está em Deus.

Dom Geremias Steimnetz
Arcebispo Metropolitano de Londrina

 

Foto destaque: Dom Geremias Steinmetz e Monsenhor José Bernard Agius, Missa no Cemitério Municipal de Rolândia, Visita Pastoral, Setembro de 2019 (Foto Tiago Queiroz)